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TIJOLINHOS - Caetano Veloso

Bogotá é quase tão cheia de tijolos aparentes quanto Londres. Na verdade há trechos de ruas que parecem exemplos de arquitetura inglesa. Mas mesmo os prédios modernos e retilíneos são majoritariamente de tijolinhos visíveis. O tom do barro é, em geral, mais claro do que o londrino, mas não dá para não pensar na Inglaterra ao ver as ruas da capital da Colômbia.

Prometi a mim mesmo que estudaria (na Wikipédia, sei lá) a história da possível influência da arquitetura inglesa sobre a bogotana, mas, para variar, escrevo sem ter tido tempo de me preparar. Dei uma parada aqui e olhei, correndo, umas fotos que surgiram quando dei enter em “arquitetura inglesa em bogotá” no Google: trechos de rua puramente ingleses escolhidos por um fotógrafo local provam que houve mais construções em estilo britânico em Bogotá do que eu pude perceber a caminho do hotel ou do teatro (este tem acústica excelente, aspecto elegante e está bem equipado de tudo).

Eu já tinha ido à cidade, com o show “Cê”, e me lembrava de ver muitos tijolinhos. Desta vez confirmei a impressão. Na verdade os tijolos me pareceram dominar a paisagem urbana agora mais do que antes. Os prédios novos seguem o figurino do sem-reboco. Da janela do meu quarto de hotel eu via muitos desses novos edifícios, alguns deles rodeando uma plaza de toros igualmente em tijolos aparentes. Isso tudo dá um ar de elegância sóbria à cidade. Sóbria mas leve e mesmo alegre, já que a argila tende sempre para um vermelho alaranjado. O fato é que, apesar do relativo desconforto por causa da altura, me senti muito bem em Bogotá.

Aproximo-me dos palcos de cidades onde sei que sou apenas conhecido de alguns poucos interessados com pena dos que saem de casa para me ver. Sempre faço o show que estou apresentando no Brasil, predominantemente relativo ao último disco lançado, e suponho que as pessoas estejam, no máximo, preparadas para reencontrar exemplos já conhecidos do meu repertório de várias décadas. Cantar canções inéditas — e talvez em estilos discordantes da ideia que muitos podem fazer da minha música — parece-me que resultará em tortura para o público. Bem, no “Cê” estavam “Sampa”, “O leãozinho”, “You don’t know me”, sei lá. Mas no “Abraçaço” as canções antigas parece-me que só são conhecidas no Brasil. Ou melhor: há canções que podem ser conhecidas de gravações de Bethânia ou de Daniela Mercury mas que o ouvinte não relaciona necessariamente a mim. Ou, como é o caso de “Alguém cantando”, está num álbum que gravei, mas nela faço apenas uma segunda voz, no refrão final, para o canto de minha irmã mais velha, Nicinha. Temi aborrecer demais os bogotanos. Mas, se “Cê” foi recebido respeitosamente (com as naturais intensificações dos aplausos para as músicas já conhecidas), “Abraçaço”, por razões que vou aprendendo com o desenrolar de seu histórico, parece capaz de agradar por si mesmo. A plateia simplesmente elege “A bossa nova é foda”, “Quando o galo cantou”, “Parabéns” ou “Abraçaço”, de cara. E o som da banda.

Por causa de minha preocupação, decidi não cantar “Um comunista”, que dura dez minutos, é lenta e fala de coisas que só os brasileiros entendem. Depois me arrependi: eles teriam gostado do tratamento dado ao tema pela banda Cê — e respeitariam o tom de “canção de protesto” tipo anos 1960, tão reconhecível para plateias hispanoamericanas. Em vez disso, quis cantar um bolero de Bola de Nieve, que adoro, e terminei, no esforço de relembrar letra e melodia, tomando talvez os mesmos dez minutos da canção que evitara.

As repetições e os comentários deram aquele tom de proximidade que agrada a alguns, mas os aplausos finais não foram dos mais calorosos. Bom mesmo foi no bis (onde sempre posso recompensar com sucessos — embora eu não tenha cantado “Sozinho”, como pediam) — quando decidi cantar a “Tonada de luna llena”, de Simón Díaz (nunca agradecerei o suficiente a Márcia Rodrigues), pela primeira vez somando alguns acordes de violão ao meu canto. Me surpreendi. Algo se revelou ali. O público reagiu à altura. Pude voltar pro Brasil satisfeito. Ainda bem que Genoino pôde ir pra casa.

Li com gosto o primeiro artigo do livro “No jornalismo não há fibrose”, de Felipe Pena. Os Racionais MCs (li na “Rolling Stone”) são pela exigência de aprovação prévia das biografias (tendência geral dos artistas de origem popular, certamente pela desconfiança de indenizações e por serem vacinados contra as certezas das manchetes). Mano Brown é o único que diz não querer falar sobre esse assunto que, para ele, não é do interesse do povo e sim um tema classista. Será?

POWER - Caetano Veloso

Há anos deixo de ir à minha cidade natal no dia de Iemanjá, 
o que não quer dizer que perco de todo a festa

No 2 de fevereiro vi as duas festas importantes do dia: o presente de Iemanjá no Rio Vermelho e o encerramento da festa da Purificação em Santo Amaro. A de Iemanjá vi em sua inteireza, mas de longe. Minha casa é no Rio Vermelho, e da varanda dá para ver os barcos que se arrumam em frente à Igreja de Santana e partem para o local em alto-mar onde o presente será jogado, não sem antes virem margeando a costa para virarem em ângulo reto em direção ao horizonte. Digo que eles vêm porque é justamente à frente da minha varanda que eles mudam de rumo. Antigamente eram sobretudo velas que coalhavam o mar. Hoje são lanchas e escunas. Quase todas brancas, a exceção sendo a grande embarcação cinzenta da Capitania dos Portos. Fazendo espuma e deixando rastro, todas seguem o saveirinho que leva o presente. O povo que vi de longe se distribuía pelas rochas que pontuam a passagem da praia da Paciência para a de Santana. O Zárabe, aquele rio veloz de testosterona, fez ouvir, primeiro na madrugada, depois na tarde do presente, suas darbukas, seus pandeirões e sua pandeiretas, Carlinhos Brown à frente. A decisão de ir a Santo Amaro no início da noite me obrigou a admitir não ir até a areia ou o asfalto: duas festas de rua no mesmo dia é demais para um velho como eu.
Há anos deixo de ir à minha cidade natal no dia da padroeira. O que não quer dizer que perco de todo a festa. A partir do dia 23 de janeiro a Praça da Purificação se ilumina e se enche de gente. As novenas. Sem falar no domingo anterior ao 2 de fevereiro, quando se dá a Lavagem e a cidade é tomada por charangas e trios elétricos. Em geral, vou a uma ou duas noites de novena e sinto o gosto da festa. Reservo o dia 2 para Iemanjá em Salvador. Este ano precisei estar no Rio até o dia 31 de janeiro. Tentei me resignar a nada ver dos festejos em Santo Amaro. Até que me dei conta de que poderia assistir a Iemanjá, que é festa diurna (embora a celebração nas barracas de bebidas siga pela noite adentro), e participar da Purificação, que é noturna (embora a procissão comece de tarde). Deu certo.

Cheguei a Santo Amaro e fui logo à igreja da Purificação (eu temia que ela se fechasse). Gostei de ter entrado ali. Os azulejos, o teto tipo barroco, as pessoas religiosas do Recôncavo. Mas fiquei intoxicado de beleza foi na praça. O parque de diversões cheio de crianças, o chafariz rodeado de grupos de samba de roda, de burrinha, de bumba-meu-boi. Sobretudo as pessoas conversando nos bancos, nos passeios, na alamedas. Minha gente.

Os grupos de adolescentes cheios de energia expressa em vaidade ingênua. Minha vida. A maioria das pessoas é escura. Os graus de mestiçagem em cada grupo particular e na multidão em geral fazem pensar. Em sete amigas, três são pretas; duas, mulatas; e as duas restantes são uma morena de cabelo liso e uma branca. Num de seis, as seis são pretas. Num outro, de cinco, três são brancas (isto é: uma morena, uma alourada de cabelo quase crespo e uma caucasiana) e duas são pretas (uma seria mulata e a outra, negra retinta).
Combinações semelhantes se dão entre grupos de rapazes, de senhoras idosas e de casais adultos. Essa observação estatística dos traços raciais se dá somente na minha cabeça escolada. Aparentemente, entre essas pessoas há apenas amizade, interesses comuns e erotismo. Digo aparentemente porque, embora eu tenha sido uma dessas pessoas que rodavam a praça com amigos de todas as cores sem contar quantos de cada cor compunham seu grupo ou o conjunto dos grupos que circulavam, eu me lembro de conhecer a consciência do quão rebaixado era, em tese, o negro. Os comentários de humor racista tampouco eram inexistentes. Mas a configuração que ainda posso ver na praça da Purificação — e a naturalidade não pensada em que ela é vivida — grita algo contra a simplificação que, desde os anos 1970, adotamos para pensar a questão racial no Brasil.

Além da emoção indescritível que me causava a visão de cenas tão conhecidas para mim, impunha-se a constatação de que é difícil enfrentar o assunto com franqueza e justiça. Difícil significa que temos de atentar para muitas feições surpreendentes que o tema toma. A mera adoção do modelo incentivado pelos cinco olhos é simplesmente inaceitável. Tanto quanto manter a hipocrisia que tão ardentemente desejei ver superada. Vendo os cabelos de Lourdinha, filha de Dona Morena, ao natural, saída ela do banho e sem passar o ferro que os esticava, sonhei, criança, com a figura de Angela Davis. Observando a paz de Gil em 1963, desejei vê-lo problematizando a questão do negro entre nós. Ter vivido para ver cabelo black power e ouvir Gil falar sobre racismo é o que me dá esperança.

CAETANO VELOSO - Parafuso

 
No dia 5 de fevereiro próximo (2014), na sede da Anistia Internacional, no Rio, haverá uma reunião para abrir o debate sobre a possibilidade de o Brasil finalmente dar asilo a Edward Snowden. Nosso país é sua escolha preferencial

Edward Snowden é uma figura forte. Sua presença pública tem o sabor das entradas individuais que desencadeiam coisas grandes na cena do mundo. Jovem, ele parece um pouco o garoto que, em “E la nave va”, deflagra, com um único gesto, a Primeira Guerra Mundial. Falo do personagem do filme e não do homem real que matou o arquiduque da Áustria porque é a captação poética do tipo de agente histórico que me interessa evocar. Snowden é a mostra de que vivemos um tempo cheio de presságios, esperanças, ameaças. O presidente do seu país de origem, Barack Obama, um mulato que é o primeiro negro eleito para o posto e que representa, não apenas por isso, todo um mundo de ideias opostas às forças conservadoras, diz sobre ele o mesmo que diria um representante dessas forças: tendo optado por fazer do que descobriu uma denúncia pública, em vez de uma queixa interna, Snowden pôs a segurança dos Estado Unidos em xeque. Mas não há no mundo quem não pense que só a denúncia externa seria eficiente contra o que Snowden achou moralmente inaceitável. Por uma volta caprichosa do parafuso da História, ele foi encontrar guarida num país em que o respeito às individualidades é oficialmente (e desde sempre) muito menos respeitado do que nos EUA: a Rússia. Não deixa de ser significativo — e, em grande medida, honroso — para nós que, vendo o tempo de refúgio temporário se esvair e querendo encontrar-se em ambiente mais confortável, ele tenha pensado no Brasil, começando a namorar-nos num texto vago, aparentemente escrito para sondar a reação das nossas autoridades, que poderá se traduzir em pedido oficial de asilo político caso exibamos simpatia. (Antes de conseguir o asilo temporário que a Rússia lhe concedeu, Snowden expediu pedido para 21 países, o Brasil entre eles, tendo sido atendido apenas por Bolívia, Venezuela e Nicarágua.)

No dia 5 de fevereiro, na sede da Anistia Internacional, no Rio, haverá uma reunião para abrir o debate sobre a possibilidade de o Brasil finalmente dar asilo ao americano. Glenn Greenwald, o jornalista a quem primeiro Snowden falou sobre os supergrampos da NSA, já disse que nosso país é sua escolha preferencial. E David Miranda, o namorado de Greenwald, é o autor da petição na Avaaz para que o governo brasileiro conceda o asilo a Snowden. Emocionalmente, é-me quase irresistível aderir à campanha de Miranda (que ficou horas preso no antipático aeroporto londrino de Heathrow sob suspeita de “terrorismo”). Não estou no Rio e não estarei lá no dia 5. Se estivesse, iria à Anistia para ouvir o debate e me sentir mais seguro para assinar a petição na Avaaz.



Falta-me sobretudo pesar racionalmente a questão. No coração, desejo que Snowden venha morar no Rio e fique muito mais apaixonado pelo Brasil do que Ronald Biggs. Vivo num mundo de sonhos cor-de-rosa e ficaria feliz se um cara como o jovem americano se ligasse mais ao Jardim Botânico do que Brigitte Bardot se ligou a Búzios. Seja como for, sinto, sem piada, que seria um gesto bonito acolher Snowden. Claro que quero que as relações entre o Brasil e os Estados Unidos possam melhorar e não sou tão desinteressado assim do assento brasileiro no Conselho de Segurança das Nações Unidas. Preferiria nada arriscar a perder oportunidades para o Brasil. Sou amalucadamente patriota. Mas é porque quero que se invente algo bom tendo o Brasil como pretexto. Claro que, num mundo ideal, eu teria meu Brasil acumulando poderes para redimensionar os valores por trás do Poder. Dessa perspectiva irrealista é que o asilo a Snowden me parece totalmente desejável. Mas não só. Há mil situações realistas entrelaçadas em diferentes instâncias dessa minha visão irreal. Faz uma semana, escrevi aqui uma série de maluquices sob a palavra “superstição”. Sou esse tipo de cara. Eu mesmo não estou certo de onde começa e onde acaba a ironia em minha ideias e em minhas frases. Deve ser o hábito da letra de música, coisa tão próxima à poesia. Basta-me que algumas palavras confusas cheguem a ser sugestivas. Aliás, nem é muito preciso dizer que isso me basta: não é que me baste, é que suponho que assim vou mais longe do que iria se me ativesse à prosa explicativa. Sonho que, se nós chegássemos a persuadir a presidente Dilma a conceder o asilo a Snowden, uma luz nova se insinuaria na Terra. Isso é vivido agora de modo um tanto supersticioso: se chegarmos a convencer o nosso governo, é porque as forças inexplicáveis estarão sinalizando que algo quase maravilhoso vai dar pé. Vejam aonde um convite para ir à sede da Anistia Internacional me trouxe. E um convite a que nem posso atender.

NEGRA - Caetano Veloso

Pessoalmente, quase só uso “preto” para me referir 
a pessoas de pele escura e cabelo crespo: “negro”

Da janela do hotel dava para ver Ponta Negra, que uma vez escalei
Natal estava sob chuva quando cheguei tarde da noite mas amanheceu ensolarada. Da janela do hotel dava para ver a Ponta Negra, que uma vez já escalei com muita vertigem (invejo Zuenir e Mary, capazes de subir dunas verticais sem se sentirem numa cena de “Gravidade”). Sempre achei o nome Ponta Negra misteriosamente apropriado. Uma razão mais lógica deve existir para a nomeação, mas a mim me parece que esse evoca a solenidade da vista. “Ponta” descrevendo a forma geográfica e “negra” dando o tom grandioso.

A palavra “negro” sugere uma preciosidade que “preto”, seu sinônimo, não suporta. Sendo ambas o nome da cor (ou ausência de cor) dos objetos de que a luz não volta, “preto” traz à mente algo fosco e pedestre, enquanto “negro” anuncia brilho e mistério. Se se fala de um vestido preto, pode-se estar falando de uma peça de roupa que se usa em qualquer lugar. Mas um vestido negro é necessariamente um traje para ocasião especial, festa noturna e de gala, ou vestimenta ritual de monjas e bruxas.

Em inglês, língua em que “negro” não designa a cor mas exclusivamente a etnia dos subsaarianos, “preto” (“black”) passou a ser preferido, para se referir aos descendentes de escravos africanos, depois que “Negro” (que se grafa sempre com a inicial maiúscula, como acontece com os toponímicos) revelou-se contaminado do valor semântico pejorativo que em “nigger” chega a equivaler a um xingamento. Não há a possibilidade de se dizer “a Negro dress” (“um vestido negro”) em inglês, exceto se se quer dizer, de modo aliás raro, que um certo vestido tem características da subcultura norte-americana afrodescendente.

Em francês há exclusividade do sentido étnico para “negro” na palavra “nègre” — que, ao que parece, já tem carga negativa há séculos. Pedro Sá imita muito bem um entrevistado de documentário de Coutinho que, ressaltando o orgulho que tem de sua ascendência, diz, em voz grave, “Preto é cor; negro é raça”. Acho curioso que “black” tenha prevalecido nos Estados Unidos, a partir do movimento dos direitos civis e finalmente difundindo-se por toda a sociedade, e “negro” seja a palavra escolhida pelo discurso racialista no Brasil.

Pessoalmente, quase só uso “preto” para me referir a pessoas de pele escura e cabelo crespo: “negro” me soa como se se estivesse querendo envernizar uma ideia simples, como quando se diz “firmamento” em vez de “céu” ou “rubro” em vez de “vermelho”. Mas às vezes parece-me que só “negro” dá a imponência que desejo sublinhar em certas figuras (acho que outro dia, aqui mesmo, falei do rosto negro de Milton Nascimento).

Há algo em Ponta Negra que exige isso. Resulta que o nome se parece muito com o lugar, embora o que o marca seja a língua cor de marfim que sobe para o céu entre duas margens de vegetação. Por alguma razão misteriosa, eu, em minha ignorância, acho que o nome Ponta Negra foi dado a essa língua de areia, não à ponta de terra que a comporta. Estive duas vezes este ano em Natal. Em ambas fiz o show “Abraçaço”. Mas agora, além do show (que foi em praça pública, para uma multidão de sumir de vista e que me comoveu ao cantar refrãos e trechos das canções do novo disco — e de seguir com respeitosa atenção a longa e lenta “Um comunista”, inclusive aplaudindo-lhe alguns versos), fiz uma palestra em parceria com o poeta Eucanaã Ferraz, sobre poesia e letra de música. Foi bonito ouvir Eucanaã falar para aquela plateia interessada, sob uma tenda armada para a Semana Nacional do Livro da UFRN. O que fez com que eu me sentisse bem quando foi a vez de eu próprio falar. Mas o melhor de tudo foi ouvir Eucanaã ler a letra de “Itapuã”, numa interpretação que me fez acreditar que aquilo era poesia.

De Natal fui para a Bahia para participar da aula inaugural da primeira escola em Santo Amaro da Universidade do Recôncavo. Minha cidade é muito negra. Digo isso e percebo quando é que uso “negro” naturalmente. Há muitas pessoas pretas, quase-pretas e mulatas. Numa mesa de calçada de um bar de esquina, conversei com meus irmãos Rodrigo e Mabel (somos mulatos). Um cara que conheci lá me contou que o povo de Santo Amaro diz que a escola que coube a nossa cidade é uma escola de mata-cachorro. Como os cursos ali tratarão de produção musical e engenharia de espetáculos, o nome que lá sempre se deu aos contrarregras de circo (mata-cachorros) foi usado para mofar daquilo que nos foi destinado.

Mas minha profecia é que dali nascerá uma força cultural que superará o crime do chumbo (como é que o Chico Oliveira diz que a luta ecológica não é enfrentamento do capitalismo?), a favelização e a tristeza. Os mensaleiros serão presos e as biografias serão soltas? Vou para Bogotá.

CÓDIGO - Caetano Veloso

Roberto Carlos só apareceu agora, quando da mudança de tom. 
Apanhamos muito da mídia e das redes, ele vem de Rei

É incrível que se queira dar agora a impressão de que os artistas reunidos na associação Procure Saber tenham mudado de posição quanto à questão das biografias. Se é para dizer que devemos equilibrar os dois princípios constitucionais — o do direito de livre expressão (na verdade o de informação) e o direito à privacidade —, isso já foi feito por Paula Lavigne em entrevista ao “Estadão” e em aparição no programa “Saia Justa”. 

O artigo de Gil que saiu no GLOBO ao lado de uma entrevista de Joaquim Barbosa (em que a edição enfatizava uma oposição que, se lidos os dois textos, era mais uma complementaridade na busca do fiel da balança) já apontava para o amadurecimento, entre nós, da discussão sobre o assunto. Eu próprio, em minhas afirmações mais definidoras, disse que os artigos 20 e 21 do Código Civil não eram bons e mereciam uma reescritura. 

Atribuí a Roberto Carlos o fato de ter sido obrigado a chegar até ali. Eu, que sempre me posicionara contra a exigência de aprovação prévia para biografias. Hoje (sexta) leio que um administrador de crises sugere que a Procure Saber seja desfeito, já que a mácula de atitude de censores pode sumir das imagens dos artistas, que são mais amados por grandes feitos ao longo de muitos anos do que odiados por uma campanha inglória, mas não da de uma associação.

Bem, o mínimo que posso dizer é que justamente meu desprezo pela ideia de cuidar de minha imagem como quem a programa para obter aprovação é o mesmo que me leva a tender para a liberação das biografias e a olhar com desconfiança para o conselho do especialista.

O que me interessa nessa confusão toda é o avanço que nossa sociedade pode ter ao deparar-se com esse quase-impasse. O pequeno artigo de Ruy Castro (não apenas um biógrafo ilustre como o pioneiro na guerra pública contra a necessidade de autorização) na “Folha” de hoje mostra, em termos simples, a inutilidade do novo discurso moderado. Mais veemente do que ele, Jânio de Freitas, um jornalista de histórico glorioso, viu na recente virada estratégica um desrespeito pior aos princípios democráticos do que na radicalidade dos primeiros pronunciamentos: ambos, Castro e Freitas, veem sobretudo dissimulação. 

Para mim, ressalta o fato de que não há novidade conceitual nenhuma, como já disse no primeiro parágrafo. Pode-se dizer que Roberto Carlos esteja se dirigindo ao público num tom de quem admite que o tema seja discutido, não como quem veta a hipótese de qualquer relativização da obrigatoriedade de autorização prévia. Mas isso porque Roberto era tido e sabido como o inimigo número um da invasão da privacidade. É notório que não era o meu caso, mas também ficou claro não ser o de Gil, Paulinha ou Djavan, por exemplo.
A defesa da intimidade é assunto palpitante no mundo atual. 

Não apenas a facilidade de entrar em correspondência eletrônica exibida pelas novas tecnologias, mas também casos como o esforço inglês de conter os terríveis abusos a que chegou sua imprensa tradicionalmente bisbilhoteira. Claro que o princípios luminosos da liberdade de expressão e do direito à informação reagiriam, como reagiram e reagirão, à ameaça que esse mundo novo apresenta. A discussão está longe de ter chegado a um termo. Não seria a mera retirada dos dois artigos do Código Civil que daria a última palavra sobre o assunto entre nós. Felizmente estamos todos sofrendo por ter ousado abrir o diálogo. 

O mero reconhecimento da importância do tema nos deveria tornar tolerantes com os vacilos, as imprecisões, as atitudes suspeitas de quem quer que tente tratar do assunto. Mas, se o tom unilateral que tomou a imprensa me causou alguma revolta, as notas e matérias que deixam entrever manobras suspeitas provocam considerável mal-estar.

O artigo de Fernanda Torres na “Folha” diz o que eu gostaria de dizer, se minha cabeça fosse centrada como a dela. Ela diz: “Sou a favor da liberação”. Mas: “Por outro lado, alguns limites merecem atenção”. E, depois de afirmar não ser justo que um criminoso lucre com o crime que cometeu, conclui que o parágrafo que se queria adicionar ao artigo 20 demanda revisão. Já há propostas de mudança nisso. A coisa vai andar. Luta iniciada pel Procure Saber. Kakay é advogado de RC, não fala oficialmente pela associação. E RC só apareceu agora, quando da mudança de tom. Apanhamos muito da mídia e das redes, ele vem de Rei. É o normal da nossa vida. Chico era o mais próximo da posição dele; eu, o mais distante. De minha parte, apesar de toda a tensão, continuo achando que estamos progredindo. 

Assunto global quente, o Brasil não pode tratar tolamente.

CAETANO VELOSO - Nomes

Hoje ouvi um locutor da FM O Dia dizer que um ouvinte com quem dialogava iria dar um alozaço para todos os outros ouvintes que seguiam o programa. Esse alô ampliado ecoava o Abraçaço do título de meu disco novo aos meus ouvidos. Mas evidentemente não tinha vindo daí. Ao contrário, o locutor usou o sufixo com a espontaneidade do hábito e eu seria capaz de afirmar que, pelo ritmo da aparição da expressão em sua fala (e pela ausência total de autoconsciência depois de proferida a palavra), ele não tinha sequer conhecimento da existência do meu CD.

 Para mim, era a glória: comprovava-se a abrangência do uso desse aumentativo. Como neguinho, que usei numa canção que fiz para o disco de Gal, gosto muito menos de ouvir ou ler abraçaço como se fosse invenção minha (ou uso que dá à expressão habitual um sentido especial) do que de reencontrar o fenômeno em estado puro. Ouço pessoas dizerem neguinho ao referir-se a um sujeito indeterminado, sem nem se lembrarem ou saberem que há aquela canção e fico feliz. Alozaço foi até mais longe do que eu esperaria. Golaço, jogaço e filmaço são as aparições mais frequentes. Mas ouço muito cansadaço e atrasadaço não tão raras vezes.

Em espanhol usa-se o azo com, no mínimo, igual liberalidade. Uma conhecida minha, uruguaia, me lembrou que muitas vezes esse sufixo indica fatos políticos pesados e nada alegres: no Chile, fala-se do golpe de 11 de setembro como o Pinochetazo etc. Na biografia de Marighella de Mário Magalhães encontrei o sufixo caracterizando um ato político dos anos 30 ou 40, não me lembro agora qual (há anos me prometo passar a fazer anotações nas páginas dos livros que leio, mas a ilusão de que minha memória é a mesma de quando eu tinha 19 ou 23 anos não me abandona quando me deparo com algo que quero guardar para citar embora já faça muito tempo que já não tenho 23 e muito menos 19 anos).

Falando de Marighella, na canção que fiz sobre ele chamo-o apenas de um mulato baiano, sem nunca mencionar-lhe o nome. Impressionou-me ler, no mesmo livro de Magalhães, que, ao ser perguntado por uma moça que se registrava no Partido Comunista quem era ele afinal (o narrador não diz o que levou a moça, aliás uma poeta, de nome Ana Montenegro, a fazer a pergunta), Marighella respondeu: Sou um mulato baiano. Ler isso foi como ouvir o alozaço do rádio hoje.

Claro que Marighella era baiano e era mulato (embora esse segundo atributo não fosse muito mencionado no fim dos anos 1960, quando me familiarizei com seu nome), mas que ele tivesse preferido identificar-se assim em vez de pelo nome é algo que só comparo à surpresa que foi ver o adjetivo clara surgir, por força da ideia e da rima, no final de um verso da mesma canção: logo depois de cantá-la (ainda preenchendo com palavras a repetitiva melodia) me dei conta de que a mulher dele se chamava Clara.

Achei tão bonito que o nome tivesse vindo assim, sem que eu planejasse, que logo precisei enumerar nomes femininos para frisar o sentido de nome próprio do adjetivo surgido (e a alegria de ter sido surpreendido por isso). E os nomes de mulher que precisei citar se mostraram logo referentes às grandes figuras femininas das religiões. Iemanjá, Maria, Iara, me pareceu abranger tudo o que precisava ser dito, as três raças (tristes?) representadas em boa rima e boa métrica inclusive com o final do nome de Maria ecoando no começo do de Iara.

Mas o verso me excitou tanto que mais ideias vieram à minha cabeça e eu quis incluir o Islã e o judaísmo. Iansã veio fazer par com Iemanjá (e dar superioridade numérica às deusas africanas) porque precisei invocar Cadija e Sara. O que me arrepiou foi que Isa Grinspun Ferraz, sobrinha de Clara Charf, que dirigiu o filme sobre o guerrilheiro, me disse que as duas irmãs de Clara se chamam Iara e Sara (esta última sendo a mãe da cineasta).

Canções nascem de muitos fatores. Um abraçaço talvez tenha nascido da palavra (embora tenha ido para longe dela, em seu tom melancólico). Um comunista nasceu do sonho de Jorge Amado de erguer um monumento a Marighella, da minha vontade de entender as posições que tomamos no leque político (para o que a crítica de Schwarz a meu Verdade tropical contribuiu), da necessidade de liberdade de tratar de assuntos que se nos impõem em formas que supúnhamos abandonadas. Meu desejo é que tudo isso possa contribuir para que aprendamos a manter a calma em momentos complexos, ricos e perigosos, como talvez sejam os dias que atravessamos. O Brasil tem podido não recair no populismo latino-americano antigo. Que possa driblar, com o charme que FH e Lula souberam demonstrar, solavancos sociais.

CAETANO VELOSO – Auto-Tune

O poder de interferir digitalmente na imagem 
(e no som) mudou o sentido do retoque.

Auto-Tune é um processador, um plug-in, que você usa para afinar uma voz ou um instrumento numa gravação. É um manipulador de pitch, altura (não no sentido popular de “volume” mas no propriamente musical de subida ou descida entre sons graves e agudos). Uma vez comparei o uso do Auto-Tune ao do Photoshop, e Fernando Salem não gostou da comparação. Eu estava tentando explicar o mal-estar que tendemos a sentir quando percebemos que uma voz afinadíssima num CD foi tratada com essa ferramenta e, além de notar falsidade na lisura da nota e mudança no timbre da voz, ficar triste por não poder mais estar seguro a respeito de um cantor novo quanto a sua capacidade musical. (Meu filho Zeca me mostrou no You- Tube uma cantora pop americana que soava afinadíssima no clipe da gravação de estúdio e muito desafinada numa apresentação ao vivo.)

O Photoshop não nos deixa seguros quanto à situação real da pele ou dos músculos de uma pessoa fotografada — para dizer o mínimo. Houve um caso em que a “Economist” retirou alguém de perto de Obama numa foto de capa (era uma dessas capas simbólicas que a “Time” popularizou, e não uma informação jornalística, mas deu discussão). Nos perguntamos que uso Stalin faria da manipulação de fotos com tamanha precisão e poder de convencimento.

Salem relembra os retoques e as adições de cor tão populares em retratos de família feitos para pôr na parede das casas. Eu completaria lembrando que as imagens das estrelas nas capas e páginas das revistas que líamos em nossa infância não estavam isentas de intervenções. Os retoques eram mais perceptíveis à primeira vista — esta é a única diferença entre os tratamentos de imagem de uma “Fatos e Fotos” e do perfeito sumiço das celulites em retratos de supermodels em revistas atuais. O poder de interferir digitalmente na imagem (e no som) mudou o sentido do retoque.

O Auto-Tune (como o Melodine e outros congêneres) também tem seus antepassados. A edição de trechos (mesmo sílabas) mais afinados, criando uma performance toda correta a partir de muitos pedaços de outras cheias de defeitos é apenas um exemplo. Mas quero ir mais longe aqui. A ideia é considerar o advento do Auto-Tune como algo semelhante ao advento do microfone elétrico. Não só Cher e T-Pain — mais Kanye West e tantos seguidores — mostram que pode haver um “cantar bem” que já conta com esse tipo de plug-in: ouvindo o jovem James Blake utilizar ferramentas de manipulação de pitch em números ao vivo (sim, mesmo entre cantores convencionais já faz tempo que se usa também ao vivo corretores de afinação, com resultados variados), percebemos que um uso artístico, propriamente musical, pode ser atingido nas relações entre o modo de cantar e o manuseio dos efeitos que essas ferramentas oferecem. Os critérios de julgamento da capacidade de cantar mudam com as novas tecnologias. Como mudaram quando microfones sensíveis deixaram para trás a necessidade de potência vocal. Quando eu era menino — e apesar da existência de Mário Reis — ainda era valor estético exigível que o cantor tivesse uma voz grande. Eu disse valor estético. Não era uma mera medição de potência vocal. Cantar bem significava poder e saber projetar intensamente a voz.

As gravações de Noel Rosa, de Cole Porter ou de Ary Barroso cantando eram acolhidas como documentos, não como performances que valessem por si mesmas. Mário Reis foi o primeiro a levar às últimas consequências o uso do microfone elétrico entre nós. Talvez seja um pioneiro mundial. Mesmo Chet Baker foi considerado um mau cantor por seus pares americanos. João Gilberto criou um estilo intrincado e tão rico a partir do uso mínimo da voz que praticamente encerrou o assunto. Mesmo assim, encontrou muita resistência entre críticos, colegas e, sobretudo, divulgadores de gravadoras.

Eu não conhecia James Blake. A bem dizer, ainda não conheço. Mas meu amigo Duda me mandou um link para uma apresentação dele no festival do Pitchfork, e eu fui olhar mais dois exemplos no YouTube. Ele usa manipuladores de altura em combinação com as intenções da emissão vocal de um modo tão sofisticado que parece ter dado um passo interessante nessa discussão.

É sabido que alguns cantores americanos fizeram questão de explicitar na contracapa de seus discos que não havia uso de nenhum artifício para afinar seus gorgeios. Outros o superexpõem. A sensação de que o uso pode ter resultados opostos ao pretendido, ou seja, fazer parecer que alguém canta bem, a gente pode ter ouvindo algumas gravações brasileiras em que o truque é usado mas o material inicial não é congenial a ele. Há uma canção que escrevi para Gal cantar que trata de modo oblíquo desse assunto, no novo disco. Passamos por todas as etapas sobre as quais falei acima durante a pós-produção da faixa. Resolvemos por deixar a voz dela sem o retoque, enquanto canta exatamente a respeito do assunto, e usamos o artifício — de modo ostensivo — apenas quando ela cantarola improvisadamente, sem palavras. E nesse uso, deixamos aparecer tanto a graça que pode advir de processos como esse quanto a relativa inadequação que pode haver entre certos estilos e sua utilização.

CAETANO VELOSO - Descarrego

Quando cheguei ao Rio com Bethânia, no final de 1964, começo de 1965, eu vinha do Méier para a Siqueira Campos, onde ficava o Teatro de Arena, que passou a se chamar Opinião por causa do espetáculo do qual minha irmã tinha sido convidada para participar, e, depois da função, íamos ao Cervantes, ao Zicartola e à Estudantina. A Estudantina Musical, gafieira que deveria ser estudada em close reading pela Liv Sovik (para livrá-la de vez do preconceito racialista), existe desde os anos 1920, hoje na Praça Tiradentes. Toda vez que volto lá entro no mesmo estado de espírito que experimentei pela primeira vez naquela época. Uma alegria da festa (coisa essencial para mim) em situação peculiar. Era como os bailes do Apolo em Santo Amaro — ou os que periodicamente aconteciam na quadra de esporte do ginásio Theodoro Sampaio —, só que com a regularidade diária de um bar e com a cultura da dança ornamental de casal enlaçado desenvolvida ao nível do virtuosismo.

Não que não tentássemos algo disso no Apolo ou no ginásio, mas na Estudantina o desenvolvimento da tradição alimentada no tango (o samba e o tango da voz e da história de Carmen Miranda) é levado ao máximo. Os ornamentos feitos com o corpo que o tango cultivou, adaptados — via maxixe — ao ritmo do samba (e à informalidade brasileira), produzem no ambiente uma felicidade que as casas de tango de Buenos Aires — muito mais sérias e estáveis, respeitáveis e mundialmente reconhecidas — não conhecem. A Estudantina é, por essas e outras muitas razões, um elemento crucial na amarração da cultura carioca. Ela sustenta hábitos, estilos e gostos essenciais para a cultura da Cidade dos Brasileiros (como João Gilberto chama o Rio), em áreas geográficas do seu perímetro urbano (e em áreas mentais de seus habitantes) onde muitas vezes nem seu nome é conhecido.
Pois bem. Dizem-me que a Estudantina está para fechar. Dependendo de um tombamento que passa pela prefeitura. O prefeito Eduardo Paes poderia agir no sentido de, no fim do seu mandato (e no desejo de estendê-lo), ligar seu nome e sua energia a um núcleo da vida carioca. Essas coisas são mais fortes do que macumba ou sessão de descarrego de igreja evangélica: ter seu nome ligado à salvação de algo tão central ao significado do Rio pode dar superpoderes ao atual prefeito, dignificando sua passagem pelo posto, se não garantindo sua reeleição no segundo turno contra Freixo (sim, o Ex-Blog do Cesar Maia explica que isso está por acontecer, embora, é claro, ele não cite Freixo nominalmente).
__________

Em “À beira do caminho” a visão da geografia brasileira corresponde à profundidade do ator João Miguel. As estradas, as chapadas, as caatingas, os serrados, os rios, as pontes, as entradas das cidades (inclusive, talvez principalmente, a de São Paulo) dizem mais do que paisagens costumam dizer em filmes bem fotografados: vão no fundo da alma e revelam um país que ainda estamos aprendendo a ver. Dira Paes já é uma instituição nacional. E nós a amamos com a atenção exigida não só por seu talento mas também pela sua sensatez. Ludmila Rosa encanta e convence. Mas são as cenas em que João Miguel dialoga com Vinicius Nascimento que refletem a força das locações. Que tenha sido “A distância” a primeira canção de Roberto a ser ouvida no filme me emociona de um modo complexo e que serve para sustentar o sentido de todas as outras (tantas!) intervenções musicais que se dão ao longo da história. Porque para mim, em primeiro lugar, essa canção está fortemente ligada ao grande cinema, já que foi a mesma escolhida por Visconti para a cena crucial de “Violência e paixão”. São conversas internas do cinema consigo mesmo, segredos, que, quando caem em meus ouvidos, me fazem chorar mais do que os lances sentimentais de qualquer trama. As moças choravam quando esses lances surgiam. Mas eu já estava chorando desde bem antes — por essas razões estranhas — e na verdade tinha de parar de chorar para atentar ao drama.

CAETANO VELOSO – Verdade

Como me ensinou meu pai: 
pior do que um comunista é um anticomunista.

Tinha tido a impressão de que este jornal quis tirar onda com a minha cara. No domingo passado, ao anunciar, na primeira página, o que o leitor encontraria aqui na coluna, os editores disseram que eu teria “adoração” por Marcelo Freixo. Achei estranho. Sempre essas chamadas vêm com ideias expressas no meu texto. Por que dessa vez houve um distanciamento? Ali se dizia, literalmente, que eu estava entre a lucidez de Fernanda Torres e a adoração pelo pré-candidato. Será que dei mesmo lugar a que se escrevesse isso? — me perguntei. E pensei: há algo errado. Nada em meu texto permitia que se usasse a palavra “adoração”. E esta palavra desqualificava quaisquer observações objetivas que porventura eu tentasse desenvolver.

Minha adesão à ideia de uma candidatura de Freixo à Prefeitura do Rio é explicitada, inclusive com a afirmação de que sou “100% Freixo”. Todas as vezes em que, ao se avizinharem eleições, senti que um candidato representaria um movimento forte no sentido do encaminhamento político que vislumbro para o Brasil, declarei meu voto sem margem para dúvidas. Ao contrário do que querem fazer crer meus maus imitadores, não vivo dizendo “ou não”. Tal definição de posições tão específicas não podia ser tachada de “adoração” por essa ou aquela personalidade pública. Ao apoiar uma possível candidatura tão desamparada pelo dinheiro, pelos esquemas existentes, pelos donos do poder, não pude deixar de achar suspeita uma tirada como essa do GLOBO. Cheguei mesmo a formular que nenhum jornalista poderia fingir para si mesmo que o uso da palavra “adoração” não teria, no contexto, o papel destrutivo que detectei. Mas me esqueci de outra verdade sobre a vida diária dos jornais: a correria, que pode levar a mal-entendidos. Não é preciso ser um paranoico clássico para atribuir intencionalidade a coisas que chegam às rotativas por acidente ou falta de tempo. Relendo o que já tinha escrito, me vi (depois de alertado por amigos e por jornalistas em quem não tenho por que não confiar) como um articulista algo mimado e temperamental. Na verdade, a frase inicial me veio junto com a lembrança de Paulo Francis escrevendo na “Folha” em resposta ao então ombudsman daquele jornal. (Não reli tal texto na publicação de uma nova antologia de Francis: como disse, ainda não li nenhuma dessas coletâneas de coisas dele, prometo fazê-lo uma hora dessas. A frase — que era, mais ou menos, “Tenho a impressão de que Caio Tulio passou a mão na minha cabeça” — reveio de memória.) E, embora aquele jornalista tenha me influenciado desde a adolescência — e eu não deixe de perceber sua presença aqui em meus escritos —, eu acabei por considerá-lo um autor mimado e dado a chiliques, aspecto que não desejo emular.

Eu teria declarado essa intenção de voto com a mesma firmeza de qualquer maneira, mas meu artigo nasceu da leitura do texto de Fernanda Torres na “Folha de S. Paulo”. Sem este, talvez eu apenas informasse o leitor sobre minha decisão. Mas Nanda questionava a viabilidade de um candidato que supostamente despreza empresários. Como explicou o próprio Freixo no “Roda Viva”, não se trata de desprezar os empresários, mas sim de rechaçar o modo viciado como vêm se dando as relações entre políticos e o poder econômico. Ele crê que isso pode e deve mudar, enquanto não chega o financiamento público das campanhas. Dizem que ele crê em muitas coisas incríveis. Mas achavam incrível a criação de uma CPI das milícias e no entanto ela foi instaurada e puniu gente. Pergunta: alguém acha oportuno uma candidatura de oposição, quando o alinhamento entre prefeitura, estado e União funciona e quando a polícia entra em favelas para ficar em vez de invadir e abandonar? Resposta: Freixo é uma espécie de oposição que ajuda o que há de bom no governante a se livrar das arapucas em que se meteu. Além de ele não anunciar o desarme do que foi conseguido, a cidade capta o valor de um gesto que indica aumento de saúde social.

XXX

Contei no domingo passado que leio o Ex-Blog de Cesar Maia com proveito. Pois bem, esta semana li lá uma nota intitulada “Uma sugestão para a Comissão da Verdade: ver o filme ‘Cidadão Boilesen’”. Quero ver esse filme. A descrição que Maia oferece causa forte impressão. Quando estive preso, ouvi, no quartel da PE da Vila Militar, gritos de dor de torturados. O fato de me terem dito ali que provalvelmente se tratava de presos comuns, bandidos da Zona Norte, fez-me pensar na brutalidade da sociedade brasileira. Sempre penso que a Comissão da Verdade deveria desnudar o mundo da tortura, que tomou ares quase oficiais durante o governo militar, mas que é prática comum nas prisões e delegacias do país. Esse filme que Maia destaca conta como empresários e banqueiros financiaram a Oban (Operação Bandeirante, o centro de informações da ditadura, que torturava), sendo que Boilesen foi o mais entusiasmado deles: gostava de assistir pessoalmente às sessões de maus-tratos. Era um anticomunista. Como me ensinou meu pai: pior do que um comunista é um anticomunista.

CAETANO VELOSO - Sobrevivendo no inferno

O que mais assombra nas euforias capitalistas é o irrealismo.

Por que a Nike lançou uma linha de tênis e camisetas com o nome de Mano Brown sem tomar a precaução de fazer um contrato com ele? Os produtos WFC Mano Brown estiveram, até faz pouco tempo, à venda em lojas da marca por todo o mundo e também na internet. A resposta é que a Nike não teme nenhumas consequências que possivelmente adviriam de um ato assim. Parece que, sobretudo num país como o Brasil, as grandes corporações agem como se não estivessem ligando muito para os direitos de indivíduos mais fracos do que elas. Digo sobretudo no Brasil porque me contam que aqui as indenizações são, por lei, calculadas a partir do poder aquisitivo de quem as recebe. Ou seja, a vítima de um uso abusivo de seu nome ou imagem será compensada de acordo com o lugar na pirâmide social que ela já ocupa: terá direito a muito se for rico; se for pobre ou remediado, terá direito a muito pouco ou a simplesmente pouco. Sendo assim, qual a empresa que fará cálculos levando em consideração a honra e a dignidade de quem quer que seja?

Mano Brown é uma referência para moradores de favelas por todo o Brasil; para músicos inteirados do que se passa na cultura popular contemporânea; para adolescentes de todas as classes sociais; para aspirantes a poetas. Chico Buarque já citou mais de uma vez o rap (ou o hip-hop em geral) como a verdadeira música de protesto do nosso tempo: não é feita por universitários bem nutridos que se comovem com o sofrimento dos excluídos, mas pelas próprias vítimas da exclusão. Os Racionais MCs, grupo de que Mano Brown é líder, representam o ápice da cultura hip-hop entre nós.

Nascido da importação de formas musicais jamaicanas por músicos do Bronx, em Nova York - não sem a referência da música eletrônica alemã do Kraftwerk, da disco music, da capoeira, dos discípulos de Marcel Marceau e dos filmes de Bruce Lee -, o hip-hop, disparado por Clive Campbell (Kool Herc) e Afrika Bambaataa, vem sendo, desde que se tornou amplamente conhecido, a partir do início dos anos 1980, a expressão mais acabada de uma mistura de nacionalismo negro com direito à visibilidade das camadas desfavorecidas. Como tal, nenhuma outra forma de arte popular ou de massas se lhe pode comparar em força internacional, superadora do modelo de distribuição que tem os Estados Unidos como centro gerador. Ainda é a vontade feladaputa de ser americano que (como, modéstia à parte, sinteticamente eu disse numa canção de homenagem a Raul Seixas) atrai jovens do mundo todo para o hip-hop, como já o fizera com o blues, o jazz, a canção da Broadway e o rock. Mas nenhum desses gêneros tinha no seu DNA (que quando eu era estudante ainda se chamava ADN) a impressão digital de criadores vindos de fora dos EUA. A Jamaica de onde veio, na memória de Campbell, a colagem de falas ao vivo com ritmos gravados, contribuiu no nascedouro, não com uma tradição primitiva a ser utilizada por americanos sofisticados, mas com uma nova formulação de elementos expressivos. Há um livro excelente sobre o assunto: "Infectious rhythm", de Barbara Browning. Assim, a ênfase no nacionalismo negro sobre o brasileiro - e a autodefinição de classe por sobre a de região ou nacionalidade - se dá de forma mais legitimada do que nunca. O álbum "Sobrevivendo no inferno", dos Racionais, é a obra-prima dessa experiência entre nós.

É por sua autenticidade e força poética que esse disco se coloca no centro do coração de tantos adolescentes desde que foi lançado, perto do final da década de 1990. De minha parte, como ponho, por programa, o sonho do Brasil acima de todos os outros elementos de todas as outras dialéticas, adivinho nesse apego das sucessivas gerações de garotada pelo rap uma vivência inconsciente da talvez principal missão do nosso país: salvar a África. Não apenas o maior dos continentes e o lugar de origem da raça humana, mas também todo o grande sentido da sofrida diáspora de seus primitivos habitantes na violência da maré montante do Ocidente e do Cristianismo. Então é com reverência que olho para Pedro Paulo Soares Pereira, Mano Brown e seus amigos que, como ele, tomaram apelidos tirados da língua inglesa: Edy Rock, Ice Blue e KL Jay.

Eles nos têm ensinado a sobreviver no inferno. Brown não pode ser submetido aos caprichos ditados pelo lucro de uma grande marca. Quem desce aos infernos está mais apto a ressurgir dos mortos e subir aos céus - e sentar-se à mão direita de Deus Pai.

A cultura hip-hop, como não podia deixar de ser, contaminou-se da ética das gangues, do mandonismo dos traficantes, da adoração à afirmação capitalista de automóveis, bebidas caras e roupas de grife: o gangsta rap americano (que não deixou de ser relevante esteticamente por isso) está cheio de exemplos. Mas isso são cores do complexo fenômeno. Em seu sentido mais abrangente e mais profundo, o hip-hop é a exibição de força dos que começam a construir a onda ascendente que há de mudar o mundo. Suas versões brasileiras são particularmente dignas. Mano Brown é o rei e o profeta. Não pode ser lançado ao desrespeito. Se ele não fez contrato com a Nike para dar seu nome a produtos dela - e não fez -, a Nike deve, cedo ou tarde, saber que tem que pagar caro pela desatenção. O que mais assombra nas euforias capitalistas é o irrealismo. O grupo de pessoas que decide passar a perna em alguém grande como Brown pensa que representa a esperteza. Na verdade, representa o delírio, o engano, a falha total.

A Casa Encantada & À Frente, O Verso.

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