O conceito de amizade caminha para uma direção muito mais madura e compensadora de relação do que foi até hoje.
A hipocrisia nas relações pessoais perdem terreno a cada dia. A internet, através redes sociais e todas as formas de comunicação de massa, nos mostram o quanto a intenção legítima é bem recebida e como as discussões sobre grandes e pequenas causas mobilizam um contingente cada vez maior de pessoas de uma forma, antes, inimaginável.
Reencontramos pessoas que não víamos há décadas. E, através delas, nos recordamos de coisas fundamentais que, talvez, nunca mais lembrássemos na vida, se não fossem esses reencontros virtuais. Os amigos reencontrados nos proporcionam a oportunidade de nos reencontrarmos com nós mesmos, quando éramos mais novos, com nossa essência perdida, com nossos sonhos e pensamentos.
E surge a oportunidade de pensarmos sobre a questão: o indivíduo muda com o tempo ou, ao contrário, quanto mais velho fica mais arraigado aos seus valores ele fica?
O que os novos tempos parecem nos dizer é que as duas afirmações podem estar certas, depende do protagonista da história.
Quem tem a sorte de ter amigos, parentes, família tem diante de si uma imensa possibilidade de continuar a amadurecer sem se tornar ranzinza e ultrapassado.
Para isso, basta ouvir as críticas das pessoas com quem convivem. Ao mesmo tempo, criticar com o chamado “espírito construtivo” faz parte das atribuições de uma amizade verdadeira.
Afinal, como podemos crescer sem que alguém nos aponte, de forma amiga e com explícita boa intenção, nossos defeitos?
Tenho uma experiência pessoal que atesta o que falei antes, e acredito que a maioria também tenha, é só tentar lembrar. Não vou entrar em detalhes, apenas resumi-la o máximo possível
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Aos quase quarenta anos, fumava dois maços de cigarro por dia, que passava sentado em frente ao computador. Pesava uns 20 quilos a mais do que quando tinha 20 anos e não conseguia subir mais do que dois lances de escada.
Esse amigo me chamou para uma conversa e me passou uma "enquadrada" daquelas que, ou a amizade sai ainda mais reforçada ou a briga é certa. Aquele que vai dar a "chamada" tem que ser muito amigo para querer se colocar nessa situação, tem que, realmente, querer muito o bem do outro. Pois, ainda bem, esse meu amigo queria muito o meu bem. E me esculachou:
- falou que eu estava gordo, meio amarelo, quase azul...Barrigudo, largado...mal cuidado. Me senti o coco do cavalo do bandido. Mas, ao mesmo tempo, eu tinha a maior sorte do mundo: tinha uma amigo que acreditava que o coco do cavalo do bandido poderia voltar a virar gente.E, convenhamos, precisa ser muito amigo pra acreditar nisso. E, mais ainda para se preocupar com isso.
Eu já sabia que ele era meu amigo. Tive ainda mais certeza. Dava pra sentir no tom de voz, no olhar e na preocupação absolutamente desinteressada. Acreditei nisso. Ainda bem.
Passou-se 20 anos daquele dia, e esse é exatamente o tempo que estou sem fumar. Peso 20 quilos a menos, voltei a jogar bola e eu e meu amigo temos uma banda de jazz instrumental que nos dá muita satisfação.
É muito importante ter bons amigos, mas se você não os ouve, de que servem a preocupação e o carinho deles?
Saber ouvir críticas, é tão importante quanto construir um bom círculo de amizades. E, como se sabe, boas amizades se constroem com tempo, atitudes, afinidades e, principalmente, respeito pelas diferenças. A amizade está acima de qualquer diferença.
O valor de uma crítica amiga e sincera, não tem preço. E, ouvi-la com a mesma atenção e boa vontade com que foi emitida, é nossa única chance de continuar a evoluir e a melhorar como seres humanos.
O olhar e a crítica de quem nos ama verdadeiramente é a oportunidade de nos observarmos como se estivéssemos do lado de fora de nós mesmos.
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