Em algum momento menos próspero dos anos 70 -certamente entre empregos ou pulando de frila em frila-, encontrei minha amiga Gardênia Garcia na avenida Rio Branco. Houve beijos e abraços pelo reencontro, e ela me convidou a subir à salinha que fazia de escritório, ali perto.
Fomos. A salinha consistia de duas cadeiras e uma mesa, esta forrada de pôsters, folders e prospectos sobre a Encyclopaedia Britannica, com ênfase na última edição, a de 1972, em 32 volumes. A qual se orgulhava de ter, entre os autores de seus artigos, luminares como Albert Einstein, André Maurois, Anna Freud, sir Alexander Fleming, Alfred Hitchcock, Anthony Burgess, Claude Lévi-Strauss, Carl Sagan, e isso apenas de A a C. O incrível é que, pela primeira meia hora, não percebi que Gardênia estava tentando me vender uma enciclopédia.
Naquela época, tendo de rebolar para fazer jus ao aluguel, à feira e ao sapato das crianças, a última coisa de que eu precisava era de uma Britannica. Pois não é que comprei a dita, e, de lambuja, ainda levei o Webster's Dictionary em três volumes e um enorme Atlas, tudo em 30 ou 40 prestações?
Bem, aconteceu que a aquisição daquela Britannica não me levou à falência, nem fez faltar feijão à mesa ou sapato para as meninas. Aliás, nos anos seguintes, seus artigos me foram tão úteis que ela se pagou várias vezes. E, hoje, graças a Gardênia, continuo possuidor da famosa edição de 1972, que tinha até Einstein e Hitchcock entre seus colaboradores.
Ouço agora que a Britannica anunciou o fim de sua edição impressa e se limitará a existir on-line e em digital, o que lhe permitirá ser atualizada de cinco em cinco minutos. Não vejo vantagem nisso. Na Britannica de papel, o mundo tinha de parar entre uma edição e outra, enquanto os luminares escreviam seus artigos.