É só aparecer a chance de uma viagem para mais ou menos qualquer lugar que já me alvoroço.
Segundo Luiz Felipe Pondé, só os loucos ainda viajam. Dou total razão a ele, e assumo que sou louca.
É só aparecer a oportunidade de uma viagem para mais ou menos qualquer lugar que já me alvoroço, e só quando começo a tomar as providências, tipo quem vai cuidar do meu gato, como pagar as contas no fim do mês, e mais mil etcs. -e isso é só o principio- percebo a insanidade que é viajar.
Quando chego ao aeroporto e vejo a fila, penso na minha casa e tenho vontade de chorar, mas aí não dá mais para recuar.
Para os loucos, como eu, existe a ilusão de que uma viagem é e será sempre a melhor coisa do mundo -aliás, nunca é-, e quando posso, meu destino é sempre Paris.
Já vou sonhando com o táxi do aeroporto para o hotel, geralmente conduzido por um motorista francês tendo, no assento a seu lado, um cachorro bem grande (em outros tempos, fumando um gauloise). No rádio, bem baixinho, música clássica; bons tempos.
Da última vez o motorista era um asiático que, além de mal falar francês e não conhecer a cidade, passou todo o tempo do trajeto falando no celular, bem alto, numa língua estranha. Foi horrível.
Logo no primeiro dia, fui avisada: "não vá ao Champs Elysées; não dá nem para andar, de tanta gente, e você ainda se arrisca a ser roubada". Fala sério: estar em Paris e não poder ir ao Champs Elysées é um mau sinal. Me privei de ver a avenida mais linda do mundo, mas vi, nos cafés, restaurantes e museus, multidões; as grandes cidades estão cheias demais.
O mundo está ficando sem graça? Está. Então as viagens acabaram? Não, não acabaram, mas têm que ser repensadas. Eu ando repensando as minhas próximas.
Segundo disse Humphrey Bogart a Ingrid Bergman, em "Casablanca", "we will always have Paris"; nós também sempre teremos Paris, mas em termos.
A razão pela qual se viaja é para ver cidades com características próprias, com coisas que só lá se encontram, mas está difícil encontrar lugares especiais, únicos, já que estão todos tão iguais.
A saída? Estou inclinada a pensar que a solução são as pequenas vilas, no interior, ainda não contaminadas pela globalização. Vamos sempre passar por Paris, claro (ouvi dizer que Roma ficou fora de questão, tal a quantidade de turistas), mas existem lugares deliciosos que ainda não foram descobertos, onde se pode ser feliz por alguns dias, longe desse insensato mundo.
Como na Europa os países não têm a dimensão continental do Brasil, a distância entre duas cidades (e até entre dois países) costuma ser pequena, o que facilita o deslocamento. Da última vez, deixei Paris e fui parar em um pequeno vilarejo na Itália com 6.000 habitantes, nada famoso (poderia ter sido na Espanha, na França, ou em Portugal).
Nele, como em quase todos, havia um pequeno palazzo abandonado, uma ruína e um café na praça, onde passei horas observando o vai-vém dos locais; depois, jantei em um restaurante que não está em nenhum guia, onde comi muito bem e bebi o vinho da região, por metade do preço das grandes cidades.
Ótimo, pois como dizem os conhecedores da gastronomia, come-se mal em Paris.
Me senti como num filme de Fellini: os personagens estavam todos lá, era só olhar para reconhecê-los. Foi uma semana tranquila, que virou minha cabeça pelo avesso, com todas as fantasias de praxe: viver numa cidade em que ninguém está conectado, sem ter conhecimento do que está na moda -nem as comidas, nem os vinhos, nem o último iPad com 350 milhões de programas, nem nada, num clima de paz total, como deve ser bom; será isso a felicidade?
Impossível saber, mas talvez a resposta seja sim.