Nos velhos romances de ficção científica uma das grandes fantasias era a criação de drogas sintéticas para tudo, não só para hibernar durante meses em viagens espaciais, mas para aprender, esquecer, lembrar, garantindo a satisfação instantânea das necessidades e vontades do freguês. Como os ficcionistas ainda não conheciam as teorias e patologias das dependências químicas, não imaginavam que esse futurismo farmacológico levaria a uma sociedade de drogados.
O futuro chegou com o relatório da Junta Internacional de Fiscalização a Entorpecentes da ONU: o uso abusivo de remédios tarja preta cresce rapidamente no mundo todo, e o número de viciados em medicamentos já supera o de usuários de cocaína, heroína e ecstasy juntos. Só nos Estados Unidos são mais de 6 milhões de dependentes de analgésicos, tranquilizantes, anfetaminas e antidepressivos. Michael Jackson é a sua mais famosa vítima.
Não sentir dor, olvidar memórias sofridas, controlar a ansiedade, a depressão, o medo, buscar por todos os meios o bem estar, a alegria, o prazer, ou simplesmente dormir, são anseios ancestrais da humanidade que a química moderna tornou acessíveis, ou quase, a todos. Hoje as farmácias virtuais vendem remédios roubados ou falsificados para qualquer um, como se fossem vitaminas. Em muitos países, receitas médicas são moeda corrente, fora de qualquer controle.
Os remédios viraram uma doença da sociedade moderna. A mesma droga que cura, em excesso, mata. No Brasil, os dados são nebulosos, mas pela quantidade assombrosa de farmácias espalhadas pelo País desconfia-se que por aqui a coisa esteja preta como uma tarja. Mais do que a repressão quase impossível, faltam educação e informação pública e privada sobre o uso e abuso de remédios, que está fazendo mais vítimas do que as drogas ilegais.
Mas nem tudo está perdido para os velhos leitores de ficção científica. Para eles, a melhor surpresa, que nem os autores mais visionários profetizaram, é a pílula da potência sexual. Alguns até imaginavam futuras drogas eróticas e afrodisíacas, mas ninguém pensava nesse pequeno, ou grande, detalhe básico.