Hoje
estou desatando da memória as imagens de amor. As minhas, as nossas
imagens de amor, porque as coisas são como são: no momento em que
escrevo e no momento em que você lê, abrimos esses arquivos de
imagens geradas a partir do amor, que são - vamos admiti-lo antes
que seja tarde - os nossos arquivos prediletos.
Tudo o
que realmente nos interessa está arquivado ali. Na câmara escura
das nossas recordações. Imagens que vamos recolhendo vida afora.
Elas têm nome e uma história para contar, cada uma delas. E
nostalgia nada mais é do que a saudade da emoção vivida, num
determinado momento que passou veloz. Emoções e emoções e ainda
tanta emoção a ser vivida!
Muito
além dos indivíduos, além das particularidades. E todas essas
químicas se processando no nosso corpo, pois há quem diga que amor
nada mais é do que uma sensação provocada, para evitar a loucura
da espécie e perpetuar o predador. Uma ilusão passageira, uma
descarga de substâncias certas no sistema. Lubrificação. Cuidados
com a máquina.
Seja
lá o que for, andei tomando resoluções práticas para a
existência.
Porque
nunca mais nesta vida quero ter saudade de beijo.
Nunca
mais a nostalgia daquele mundo de línguas dançando balé no céu
das nossas bocas.
Nunca
mais!
E
juro que nunca mais nesta vida quero tentar entender o amor.
Quero
deixar que ele passe por mim, como um pé de vento que sopra folhas e
poeira num arranjo aprumado.
Eu
fico ali, no meio do redemoinho, só achando tudo muito bom.
Depois,
o amor se vai e a gente continua a tocar a existência.
Assim
é que deve ser.
Nunca
mais nesta vida quero gente se indo. Já está de bom tamanho.
Coração
da gente vai absorvendo os golpes: que são muitos e de todos os
lados, sempre.
Com
quase todo mundo é assim.
De
repente, as pessoas começam a ir embora, por morte matada e morrida,
por
desamor, por tristeza, por ansiedade, por medos diversos, seu coração
vai recebendo as pancadas e uma hora dá vontade de dar um berro,
sair vomitando as mágoas todas que a gente foi engolindo.
Nunca
mais gente partindo sem motivo aparente, sem dar nome aos bois ou uma
denúncia vazia. Nesta vida, nunca mais!
E
nunca mais, nesta breve passagem, a palavra não dita, o gesto parado
no ar, dissolvido antes do afago. Nunca mais a dose nossa de orgulho
besta,
a
solidão das noites perdidas por amor desenganado, o coração
parado, à espreita. Isso, não. Quanto mais o tempo passa, mais a
urgência da felicidade ilusória e da química do bem-estar, essas
coisas todas que se operam em nossos íntimos.
Nunca
mais.
Nunca
mais um dia atirado ao nada, nunca mais o verbo que não se completa,
todas as palavras que não foram ditas - verdades -, todas elas,
uma
após a outra, formando frases, pensamentos, sentimentos, amor
costurando o texto, que é linha que não refuga de jeito nenhum.
Nunca
mais!
O
coração se magoando todo o dia, a gente engolindo sapos e lagartos
e se esquecendo de que é capaz de mudar cada uma das histórias,
reescrever o livro das nossas vidas.
Uma
hora mais cedo e a cena teria sido outra ou o que teria acontecido
se
você não tivesse ido àquele lugar, àquela noite, quando o
universo conspirava contra nós, ou a nosso favor?
Quem é
que vai nos explicar?
Ninguém.
Ou alguém