Lembra quando há muitos, muitos anos, você ia passar as férias na fazenda? Ah, uma fazenda tem aromas absolutamente inesquecíveis: o do capim, o da terra depois da chuva, o do estábulo onde se ia de manhã bem cedo tomar o leite tirado da vaca, ainda morno, numa canequinha de alumínio. E o cheiro da tangerina? Aliás, tangerina não, mexerica; aquela pobrinha, modesta, de casca fina, que deixava a mão cheirando durante três dias. Esse é um cheiro muito alegre. O cheiro do bolo saindo do forno é para sempre – bolo de tabuleiro, cortado em losangos, com cobertura de açúcar com limão, e um detalhe precioso: naquele tempo, por mais que se comesse não se engordava, e em cima da mesa havia sempre um vidro de fortificante para abrir o apetite. Que felicidade ter tido uma infância no interior! Mas existem outros aromas não ligados ao paladar e também inesquecíveis. O cheiro do mar quando se chega em Salvador – uma licença poética, com licença. E você já teve uma tia-avó que morava numa casa bem arrumada, cujo assoalho era encerado toda semana? O brilho era dado a mão, com uma escova de cabo alto como uma vassoura, e era chegar e ouvir: “Cuidado para não escorregar”. Que cheiro limpo, honesto, que cheiro de gente direita. Será que isso ainda existe?
Mas há também os cheiros angustiantes: os de hospital, de sala de cirurgia. Muito cheiro de flor você sabe o que lembra – melhor não falar disso. E existem os perfumes ricos: de carro novo, de um bom fumo de cachimbo. E vamos combinar: cheiro de alho é bom na cozinha, de sexo no quarto, e é proibido misturar. Por falar nisso, o cheiro do homem que se ama, depois do amor, é melhor nem lembrar para não desmaiar de saudade.
As cidades também têm seu cheiro, cada uma muito particular: se você for levada, de olhos vendados, para o Bloomingdale’s, sabe na hora que está em Nova York. E se respirar um aroma de cominho misturado a curry e a canela vai saber que está no souk de Marrakesh.
Mas existe um cheiro que só as mulheres conhecem. É o que elas sentem quando estão enxugando seus bebês depois do banho. É preciso que não haja uma só pessoa por perto num raio de 200 metros para não haver interferência de qualquer ordem. Sem nenhuma presença estranha – nem mesmo a do pai –, mãe e filho poderão dizer bobagens e rir de coisas que só eles vão entender. Depois do talco, a mãe vai botar o nariz no pescoço de sua cria e cheirar com todos os seus cinco sentidos. No princípio timidamente, mas cada vez mais forte, até quase arrebentar os pulmões de tanto amor. Na hora a gente não sabe, mas um dia vai saber: não existe nada igual a esse cheiro nem a esse momento, e nunca vai haver um melhor. Porque esse é o cheiro da vida.