Sabe o que é não ter noção se R$ 5 milhões por uma
caixa de fósforos é caro ou barato?
Já vivemos isso
Quando o AI-5 nos foi imposto, em 13 de dezembro de
1968, antes passou pelo endosso do primeiro escalão de Costa e Silva. Quando
foi a vez de o vice-presidente Pedro Aleixo assiná-lo, ele se recusou.
-Por acaso o sr. teme que o presidente faça mal uso
deste instrumento?
-De maneira nenhuma temo o presidente. Mas, quando o
arbítrio e o autoritarismo se instalam nas altas esferas, eles descem em
cascata até o guarda da esquina. A esse eu temo.
Estava estabelecida a "Lei de Pedro Aleixo",
de grande utilidade para a compreensão da natureza humana: se os maiores impõem
seu estilo autoritário, os idiotas o copiarão.
Que Madame tem estilo autoritário e comando
destemperado, que não reconhece erros (ao ponto de achar que as manifestações
nada têm a ver com ela), que ninguém tem coragem de discordar dela, que é
cercada de sabujos e que há um monte de idiotas na ilha da fantasia a copiá-la
estamos cansados de saber.
Meu ponto hoje não é esse. É algo muito mais grave.
Como Madame acha que entende de economia --declarou que o ajuste fiscal e
contas bem feitas, propostas daquele ministro da Fazenda que queria erguer uma
estátua para o Malan, por ele ter saneado as contas públicas, eram propostas
"rudimentares"-- e estava convencida de que "um pouquinho de
inflação" ("levemente grávida") não fazia mal, a dita cuja está
de volta.
Não vou mencionar que a "margem tolerada da
meta" já furou o teto, "mas só a cabecinha", porque primeiro:
ela é tolerada por quem? Segundo, porque quem gasta mais seu dinheiro em
alimentação (os pobres) sabe no bolso que a inflação anunciada é muito menor
que a real.
A razão de ser deste artigo é o fato que tenho idade
bastante para me lembrar dos tempos de inflação de 80% ao mês, quase vivi num
sonho de 20 anos com inflação civilizada e morro de medo do pesadelo que
aqueles tempos foram.
Podia resumir o pesadelo da hiperinflação como sendo a
perda da noção de valores. Deus nos poupe dos "salvadores da pátria",
pois sempre aparece um, de tão horrível que é a situação. Hitler foi um deles.
Outro papou nossa poupança.
Noção de valores. Sabe o que é não saber se R$ 5
milhões por uma caixa de fósforos é caro ou barato? Pois, jovem, acredite, já
vivemos tempos assim. Eles tinham uns truques para enganar otário, como
eliminar três zeros da moeda a cada seis meses e renomeá-la com a mesma
rapidez. Carlos Chagas estampou a nota de dez dinheiros (sabe-se lá como a moeda
se chamava). Sua família exultou. Porém, pouco durou aquela emoção. Mais seis
meses e a nota era recolhida como obsoleta para o "novíssimo cruzadeiro
novo" (houve tantos nomes...).
Mas, junto com a perda de noção de valores monetários,
vinha a perda de autoestima, a perda de valores éticos, o estímulo à ganância,
a facilitação da vigarice e da trapaça, já que ninguém sabe se e como está
sendo roubado.
Madame, que teve seu tempo de lutar pelos proletários,
agora vai deixar que eles sejam roubados pela inflação?
Você acha que temos muita corrupção? Espere para ver.