De tudo o que saiu no jornal ultimamente, o que mais me tocou foi a notícia de que as duas últimas casas da Avenida Atlântica estão vindo abaixo.
Cresci numa Copacabana que tinha tantas casas na praia que a gente nem se dava ao trabalho de contá-las. Outros tempos. Tinha um posto de gasolina. Tinha uma revendedora de carros importados. O consulado da Áustria, uma das duas que sobraram, ficava ao lado de outro consulado. Seria o da Romênia? Já fiquei triste quando a casa de pedra _ a outra que tinha sobrado _ transformou-se em sede de agência imobiliária.
Mas era outra Avenida Atlântica. Só tinha uma pista de carros, não tinha calçadão central, aliás não tinha calçadão algum... era só calçada mesmo. Não tinha quiosque. A calçada de ondas de pedras portuguesas só era interrompida por carrocinhas da Kibon e, mais tarde, por carrinhos da Geneal.
Ali no Posto 6 tinha uma rua, estreitinha, que ia dar na Avenida Copacabana. No meio da rua tinha uma galeria de arte e uma loja de churros. Eu preferia os churros. A gente assistia a um filme do Zé Trindade no Cine Royal, ali na Galeria Alaska, e, depois, comia churro na tal ruazinha. Tinha o Cine Rian, que ficava de frente pra praia e de fundos pro único Bob’s da cidade. Tinha o Cassino Atlântico desativado e transformado em TV Rio. Eu frequentava o auditório da TV Rio para assistir à Grande Gincana Kibon, com Vicente Leporace. Na hora de anunciar os intervalos, o Leporace gritava enigmático: “Miguez, chegou a tua vez”. Lá em casa, todo mundo ia assistir ao “TV Rio Ring”, nas noites de domingo, só para aparecer no “passeio das câmeras”. De vez em quando, iam também no “O riso é o limite”, o show de sábado.
Era muito comum ter ressaca. A água invadia as calçadas e chegava nas garagens dos prédios. Os carros boiavam. Quando fizeram o calçadão, diziam que uma das vantagens seria o fim das ressacas. A missa das seis de todo domingo era na igrejinha do Forte de Copacabana. Dentro do forte mesmo. Nenhuma igreja do mundo ficava em lugar tão bonito. Depois, muito depois, a igrejinha foi transferida para a Francisco Sá e virou paróquia da Nossa Senhora da Ressurreição. Muita gente parou de ir à missa. Dizem que, agora, dentro do forte, tem uma Confeitaria Colombo. Eu nunca fui lá.
Tinha a lanchonete Six, a única da cidade em que se podia comer hambúrguer e tomar milk shake numa mesinha à beira mar. Tinha a Fiorentina _ agora, você vai dizer que ainda tem, mas na Fiorentina daqueles tempos tinha a Zélia Hoffman recebendo os fregueses. Tinha a Cantina Sorrento, já quase no fim do Leme. O cliente tinha que escolher. Ou ia à Sorrento ou ia à Fiorentina. Era quase uma postura política frequentar uma ou outra.
No sábado, depois do carnaval, a escola campeã desfilava na avenida. Eu me lembro da Mangueira mostrando “O mundo encantado de Monteiro Lobato”. Descubro no Google que foi em 1967. Mas me decepciono ao perceber que, quando se digita “o mundo encantado de”, Monteiro Lobato nem aparece. O Google privilegia Beatrix Potter, Richard Scarry e uma certa (ou um certo) Gigi. Não conheço nenhum dos três.
Daquele tempo, sobraram o Clube Marimbás e a Colônia de Pesca do Posto Seis. Temo pelo futuro deles. Os dois exemplos não combinam com a Avenida Atlântica sem casas.