Ainda não estive com o
livro nas mãos, mas já ouvi algo a respeito e me parece que deve ser uma
leitura não só interessante como necessária. Chama-se O culto da emoção, do
filósofo francês Michel Lacroix, em que ele defende que a busca irrefreável por
emoções fortes, tendência dos dias de hoje, é, no fundo, um sintoma da nossa
insensibilidade. "É de lirismo verdadeiro que precisamos, não de
adrenalina", diz o autor. Ou seja, andamos muito trepidantes e frenéticos,
mas pouco contemplativos.
Generalizando, dá pra
dizer que todos nós estamos meio robotizados e só conseguimos nos emocionar se
formos estimulados pela velocidade e pelo risco: só se houver perigo, só se for
radical, só se for inédito, só se causar impacto. Não que isso deva ser
contra-indicado. Creio que uma dose de enfrentamento com o desconhecido faz bem
para qualquer pessoa. Testar os próprios limites pode ser não só prazeroso como
educativo, desde que você se responsabilize pelo que faz e não arraste
forçosamente aqueles que nada têm a ver com suas ambições aventureiras. Vá você
e que Deus lhe acompanhe.
O que não dá é para se
viciar em novidades e perder a capacidade de comover-se com o banal, pela
simples razão que emoção nenhuma é banal se for autêntica. Só as emoções
obrigatórias é que são ordinárias. Nascimentos, casamentos e mortes emocionam
apenas os que estão realmente envolvidos, senão é teatro - aquele teatrinho
básico que se pratica em sociedade.
Lembro como se fosse
ontem, mas aconteceu há exatos vinte anos. Eu estava sozinha - não havia um
único rosto conhecido a menos de um oceano de distância - sentada na beira de
um lago. Fiquei um tempão olhando pra água, num recanto especialmente bonito.
Foi então que me bateu uma felicidade sem razão e sem tamanho. Deve ser o que
chamam de plenitude. Não havia acontecido nada, eu apenas havia atingido uma
conexão absoluta comigo mesma. Não há como contar isso sem ser piegas. Aliás,
não há como contar, ponto. Não foi algo pensado, teorizado, arquitetado: foi
apenas um sentimento, essa coisa tão rara.
De lá pra cá, nem hino
nacional, nem gol, nem parabéns a você me tocam de fato. Isso são alegrias
encomendadas e, mesmo quando bem-vindas, ainda assim são apenas alegrias, que é
diferente de comoção. O que me cala profundamente é perceber uma verdade que
escapou dos lábios de alguém, um gesto que era pra ser invisível mas eu vi, um
olhar que disse tudo, uma demonstração sincera de amizade, um cenário
esplendoroso, um silêncio que se basta. E também sensações íntimas e
indivisíveis: você conquistou, você conseguiu, você superou. Quem, além de
você, vai alcançar a dimensão das suas pequenas vitórias particulares?