Sabemos que o amor sempre foi um tópico que rendeu muitas reflexões e opiniões. Foi e segue sendo fonte de inspiração para muitos poetas, escritores, pensadores e filósofos desde que se tem registro do tempo. Não é uma exceção que esse conhecido filósofo da Antiga Grécia chamado Platão tenha falado sobre esse mesmo tema.
Alguns dados sobre Platão
Platão foi um filósofo grego discípulo de Sócrates e professor de Aristóteles. Foi responsável por muitos estudos e textos, entre eles “O Banquete” e o “O mito da caverna”. No primeiro título Platão desenvolveu sua concepção sobre o amor, que é a base do conceito de amor platônico em sua posterior definição.
O amor para Platão é uma motivação que nos leva a conhecer e contemplar a beleza em si. A beleza contemplada, no entanto, segue os princípios do dualismo, que é um dos pilares que sustentam toda a sua filosofia. Essa corrente filosófica – o dualismo – baseia-se na teoria de que a realidade é formada por duas substâncias independentes e que jamais poderão se misturar: o espírito e a matéria.
Essas duas substâncias podem se juntar, mas não se misturar. Platão considerava que o ser humano era composto por uma alma e um corpo, em que a alma pertencia ao plano das ideias e o corpo ao plano material. A alma, portanto, coexiste com o corpo, onde na verdade aquela se encontra presa. São duas realidades independentes.
A partir dessa concepção filosófica, Platão desenvolveu seu conceito de amor. Entendido de forma errada por muitos, chegando inclusive a existir a ideia de que o amor platônico propunha uma abstenção, um amor espiritual, quando isso nunca aconteceu nem foi verdade. O amor proposto por esse filósofo está na verdade em um caminho intermediário entre esse conceito e o amor carnal. Ele evita a promiscuidade, mas também a abstinência, já que para ele a moral significava conter-se.
O amor
A grande quantidade de usos, significados e sentimentos que esse conceito inclui torna a tarefa de o definir quase impossível. Dessa forma, uma das características essenciais do amor é que se trata de um conceito universal que envolve uma infinidade de sentidos e diz respeito a um afeto entre seres.
Na língua portuguesa, a palavra amor abrange um grande quantidade de sentimentos diferentes. Vai desde o desejo passional e de intimidade do amor romântico, até a proximidade assexuada do amor familiar. Também inclui a profunda devoção do amor religioso e o afeto por amigos.
Seja qual for o tipo de amor do qual estejamos falando, as emoções que estão presentes são sempre bastante poderosas. Se quiséssemos catalogar essas emoções, poderíamos classificá-las como irresistíveis, sendo impossível fugir do amor. É um sentimento que age como importante facilitador das relações interpessoais. É fonte de inspiração para as artes e objeto de estudo para a psicologia.
“O que é feito por amor está além do bem e do mal”.
-Friedrich Nietzsche-
O que é o amor platônico?
O adjetivo “platônico”, incorporado ao conceito de amor, alude à doutrina desse filósofo grego. Platão, no discurso de Sócrates, aponta que o amor é uma motivação ou um impulso que nos leva a tentar conhecer e contemplar a beleza em si. A amar as formas ou ideias eternas, inteligíveis, perfeitas e que vão além da beleza física que podemos apreciar – sem excluí-la, no entanto.
Em outras palavras, para esse filósofo o amor surge do desejo de descobrir e admirar a beleza. O processo tem início quando alguém aprecia a beleza física e depois progride até a beleza espiritual, tendo como estágio mais avançado a admiração pura, passional e desprendida da essência da beleza.
Dessa forma, o amor platônico em si não tem a ver com um amor inalcançável ou impossível. Tem a ver com um amor que transcende as fronteiras da beleza física, sendo por isso difícil de alcançar. Não há elementos sexuais da forma como os conhecemos simplesmente porque o autêntico amor para Platão não é o que se dirige a uma pessoa, e si um que orienta em direção à essência que transcende a beleza em si.
Na obra “O Banquete” de Platão, o conceito é colocado da seguinte forma:
“Deve considerar mais valiosa a beleza das almas que a beleza do corpo, de modo que se alguém for virtuoso na alma, ainda que tenha uma aparência não desejável, já será suficiente para amar, cuidar, cultivar e buscar ideias tais que façam melhores os jovens, para que seja obrigado, uma vez mais, a contemplar a beleza que reside nas normas de conduta e a reconhecer que todo o belo está relacionado entre si, e considerar dessa forma a beleza do corpo como algo insignificante”
A beleza e o amor em Platão
Segundo Platão, ao nos depararmos com a beleza surge em nós o amor, que pode ser definido como o impulso ou a determinação que nos empurra a conhecer e contemplar. Trata-se de uma série de fases que ocorrem de forma gradual, sendo que se aprecia em cada uma delas um tipo de beleza particular:
• Beleza corporal: é a primeira fase. Tem início com o sentimento de amor direcionado a um corpo belo em particular, que evolui para apreciar a beleza em geral.
• Beleza da alma: depois de superada a barreira de apreciar e se apaixonar pelo aspecto físico de uma pessoa, começamos a focar o interior dela; tem a ver com o que está relacionado ao plano moral e cultural de uma pessoa. Nessa fase o amor transcende o aspecto corporal, o aspecto físico, atingindo o aspecto interno, a alma.
• Beleza da sabedoria: o caminho de apreciar a beleza do espírito e da alma conduz inequivocamente o amor para outros conhecimentos, o das ideias; isso vai mais além da própria pessoa amada.
• Beleza em si mesma: quando alguém foi capaz de superar as três fases anteriores, abre-se uma nova e última porta que é a possibilidade de experimentar o amor pela beleza em si mesma, desprendida de qualquer objeto ou sujeito. Esse é o nível de amor supremo, o maior de todos.
Esse último passo é caracterizado por conhecer a beleza de forma apaixonada e, portanto, desinteressada e pura para Platão. Contempla um sentimento que não se corrompe e nem muda com o passar do tempo. Por isso, não se trata de um amor impossível em si, mas sim de um que se basta na apreciação das ideias e das formas perfeitas, inteligíveis e eternas.
Por que o amor platônico foi entendido como um amor inalcançável?
A expressão “amor platônico” foi usada pela primeira vez por Marsilio Ficino no século XV. O uso foi feito a partir do conceito de que o amor platônico era um amor concentrado na beleza do caráter da pessoa, na sua inteligência, e não na aparência física. Não obstante, é um amor unicamente presente no mundo das ideias, em que é considerado perfeito e incorruptível.
Segundo Platão, na realidade não é possível alcançar a pureza desse sentimento devido ao fato de que o amor não é baseado em interesses, e sim na virtude, e isso não se alcança em nosso mundo. Ou seja, seria um amor perfeito, e a perfeição é, por si só, uma ilusão no mundo real – não existe nada perfeito – pois só pode ser possível em um mundo de ideias e virtudes, que difere do nosso mundo material.
Para simplificar a ideia, pode-se dizer que o que se entende por amor platônico é o que é idealizado, transcende o corpo e por isso não abrange nem o desejo sexual. Na linguagem coloquial fala-se do amor platônico como o sentimento romântico que se tem por uma pessoa que, por algum motivo, não é alcançável. E por isso esse amor também não inclui um vínculo sexual.
Nesse sentido, a expressão guarda um paralelo com o que o filósofo diz a respeito do amor. Só está, no entanto, falando de uma pequena parte da concepção de amor que Platão desenvolveu, e com meios errados para chegar ao mesmo fim. É uma conversão da expressão em um erro de uso coloquial e frequente.
O que o amor platônico contempla?
Segundo Platão, o belo é igual ao justo, ao bom e ao verdadeiro. Dessa forma, o amor busca e precisa do belo, do justo, do bom e do verdadeiro, correndo atrás disso. Em resumo, o amor platônico alude à tarefa de buscar e encontrar a parte da alma que nos falta a partir de outra pessoa, mas uma pessoa que se torna a representação para nós de todo o bom, o belo, o verdadeiro e o justo.
Por esse motivo o amor platônico não é realmente um amor impossível ou inalcançável. É um caminho, um meio, que evidentemente pode incluir o sexual, mas que não é o seu ponto central. Pode-se gerar um corpo, pode-se fecundar um corpo, mas é mais que isso. É se apaixonar pelas ideias, pela alma de outro ser. Com ou sem exclusão ou inclusão corporal e sexual, ultrapassa tudo isso transcendendo a matéria de que somos feitos.
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