Pascal Bruckner, afirma que a felicidade é um estado de graça e não um sentimento permanente e, por isso, nunca podemos produzi-la a partir de algo. Somos felizes por alguns instantes e, depois, esse sentimento se transforma em nostalgia e angústia.
O escritor, ensaísta e filósofo francês Pascal Bruckner é autor de livros de ficção e de não ficção. Seu romance Lua de fel se tornou um filme bastante elogiado, dirigido pelo polonês Roman Polanski.
Além de proferir palestras pelo mundo, Bruckner também participa de programas de televisão e é colaborador de uma das principais revistas francesas, a Le Nouvel Observateur.
Bruckner é um reconhecido crítico do multiculturalismo. Apoia o direito à especificidade das minorias étnicas, religiosas e culturais, defendendo a sua assimilação respeitosa pela comunidade que os recebe, retomando todo um debate que reacende o Iluminismo.
Saiu em defesa da escritora de origem somali e então deputada no Parlamento holandês Ayaan Hirsi Ali, condenando, neste debate, a visão do historiador Timothy Garton Ash e do escritor Ian Buruma a respeito do assassinato do diretor e produtor de cinema.
Leia a transcrição da fala logo abaixo e o vídeo no final da postagem.
“A felicidade é uma coisa que acontece com a gente, me parece. Não é algo que provocamos apenas pela força do desejo, pois se provocássemos a felicidade apenas pela força do desejo, todos nós seríamos felizes para sempre. Todos nós conhecemos esses momentos aflitivos, como quando organizamos nossas férias com os melhores amigos. Escolhemos a mais bela casa à beira mar, a melhor localização, a melhor estação, os melhores amigos, e então por uma série de acasos infelizes, as férias são uma catástrofe. Os amigos são odiosos, o tempo está chuvoso (como acontece com frequência na França), o mar está agitado, a casa tem muitos defeitos e, quinze dias depois, todos vão embora aborrecidos jurando nunca mais se encontrar nas semanas seguintes.
Ao contrário, todos nós já tivemos a experiência dessas festas que esperamos com certa apreensão, com pessoas que não conhecemos ou de quem não gostamos muito e, pelo milagre de uma fusão, ou de uma correspondência, acaba sendo uma festa maravilhosa, onde alguma coisa, um fluído passa entre os convivas.
Parece-me que, do mesmo modo, nós temos a possibilidade, como indivíduos livres, de afastar de nós as adversidades que podem nos acontecer. A sabedoria nos recomenda não nos atirarmos sob as rodas de um automóvel, não nos pendurarmos na janela do 15º andar, não engolir qualquer coisa à mesa, não beber a água da sarjeta em respeito à nossa saúde, mas, por outro lado, nunca temos a possibilidade de fabricar a nossa felicidade a partir de coisa alguma.
Em outras palavras, me parece que a felicidade, e ela existe, depende de uma noção religiosa que provavelmente deve ser adaptada aos nossos tempos seculares, ela depende da graça.
Parece-me que a felicidade é um pouco análoga à visitação de uma providência simpática, de um espírito feliz que, durante algumas horas, alguns dias, alguns meses, nos inunda com seus benefícios. E então, um dia, sem nos darmos conta, ela se vai e nos deixa, evidentemente, em um estado de grande nostalgia, na esperança de que ela volte. Eu diria: deixemos ao acaso o cuidado de organizar nossos momentos de felicidade, deixemos à nossa sensibilidade a inteligência de reconhecer a felicidade quando ela chega, e deixemos à nossa prudência o cuidado de evitar as infelicidades quando elas passam por perto.
Gostaria de concluir com um poema curto de um alemão do século 15, que li uma vez, mas nunca encontrei o nome e nem o menor rastro dele.
Eis o poema:
“Nasci não sei quando,
estou aqui e não sei por que,
vou para não sei aonde,
e no entanto, inexplicavelmente,
eu sou feliz”.
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