No livro “Contos morais”, do escritor sul-africano
J.M. Coetzee, assistimos ao declínio da personagem
Elizabeth Costello, alter ego do autor.
“Contos
morais” é o mais recente lançamento de J.M. Coetzee, escritor sul-africano
vencedor do Nobel de literatura em 2003, no Brasil. Traz sete narrativas
breves, escritas entre 2008 e 2017, e em cinco delas o envelhecimento de
Elizabeth Costello, personagem que também é seu alter ego, serve como fio
condutor da história. Coetzee a consagrou no livro “Elizabeth Costello”, de
2004; no entanto, ela já era protagonista em “A vida dos animais”, quando
discorre sobre as questões filosóficas e éticas que envolvem nossas relações
com os bichos. São almas gêmeas: além de escritores e vegetarianos, ambos
enfrentam os desafios da velhice – em fevereiro, Coetzee completará 82 anos.
“Vaidade” trata do aniversário de 65 anos de Elizabeth. Quando os filhos, John e Helen, e a família dele a veem, levam um choque. A idosa, “que sempre usou o cabelo severamente curto”, tingiu as madeixas e está usando maquiagem. Não há reprovação explícita, mas estranhamento. “Não é para sempre. Fiquem tranquilos, é por pouco tempo. Vou voltar a ser eu mesma na hora certa, quando acabar a temporada. Mas quero que olhem para mim outra vez. Só uma ou duas vezes mais na minha vida, quero que olhem para mim como se olha para uma mulher. Só isso. Só um olhar”, é o que diz. Imagino que muita gente vai se identificar...
Em
“Quando uma mulher envelhece”, Elizabeth está com 72 anos e ainda vive na
Austrália, seu país de origem. Em visita a Helen, que dirige uma galeria de
arte em Nice (França), descobre que ela e John gostariam que se mudasse para
perto de um dos dois: ou para um apartamento no mesmo prédio da filha, ou para
a casa dele, em Baltimore, nos EUA. “Por que eu imporia a minha filha o fardo
de cuidar de mim? E acredito que para você a questão seja: será que consegue
conviver consigo mesma se não se propuser, ao menos uma vez, com toda
sinceridade, a cuidar de mim e me proteger?”, questiona, fazendo questão de
manter sua autonomia.
No
conto seguinte, “A velha e os gatos”, Elizabeth fez uma escolha radical, na
direção oposta da que os filhos desejariam. Mudou-se para um povoado espanhol,
onde vive numa casa rodeada de gatos meio selvagens. Ali também mora Pablo, um
homem com problemas cognitivos de quem, na verdade, ela cuida. Para horror do
John, conta que ele vai herdar aquela casa e terá a missão de alimentar os
gatos. “Estou me preparando para o próximo lance. O último lance”, afirma.
O
quarto conto é “Mentiras”, que começa e termina com uma carta de John para a
mulher, Norma. Ele está de volta ao povoado espanhol depois que a mãe sofreu
uma queda e passou um período internada. Sua situação é frágil, mas ela se
recusa a acolher a ideia de ir para uma instituição. No último, “O matadouro de
vidro”, Elizabeth confessa: “eu não sou mais eu mesma, John. Está acontecendo
alguma coisa comigo, com minha mente. Esqueço das coisas. Não consigo me
concentrar”. Insiste em compartilhar com o filho relatos sobre a crueldade com
os animais, que vai ser seu legado: “depois que eu for embora, haverá apenas o
vazio. Será como se eles nunca tivessem existido. Por isso é que eu escrevo
sobre eles e por isso eu quis que você lesse sobre eles. Para passar adiante a
memória deles, para você. Só isso”. Ninguém lê Coetzee impunemente.
Fonte:
G1
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Estou cada vez mais ligada aos animais. No meu blog publiquei um texto intrigada porque os animais não emitem som algum ao serem feridos de morte. http://soniafs.blogspot.com/
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