A
bicicleta, no meio daquela grande vitrine natalina, chamou-lhe a atenção. Era
vermelha e modelo BMX, parecida com a primeira bicicleta que dera ao filho. Há
mais de 30 anos. A lembrança foi automática e dolorida.
Na noite da véspera de Natal, perto do horário de fechar, os shoppings se tornam o maior dos infernos para quem está ali apenas para comprar um sifão da pia, que estourou.
Até a loja de materiais de construção se apropriou do Papai Noel e colocou um
pobre velhinho fantasiado para vender vasos sanitários e Box blindex em 12 vezes,
porque é Natal.
Parou
de tentar gostar de Natal já tem tempo, na verdade, não suporta a data. Gosta
de passá-la como se não houvesse.
De
tudo que já havia perdido, o contato com o filho era o que mais lhe doía. Esse
seria o décimo ano, o décimo natal desde que haviam rompido. Nem uma troca de
palavra sequer durante toda essa eternidade. Tentara a reaproximação de diversas maneiras, durante todos esses últimos anos, mas nunca obtivera resposta alguma.
Quando
saiu, o shopping já estava praticamente fechado, assim como todo o comércio do
bairro. Existe apenas uma noite, no Rio de Janeiro, em que os bares
restaurantes, farmácias e todo o resto do comércio fecha; na noite de natal.
Voltando
para casa, pelo caminho mais longo, foi vendo o tráfego ir se reduzindo, os
pontos de ônibus se esvaziando e pensou que não trocaria o sifão naquela noite.
Queria apenas dormir. Definitivamente, o natal não lhe faz bem.
Ele
sabe, já passou várias dessas meias-noites na rua, por livre vontade. Saía de
casa alguns minutos antes e passava a meia-noite na rua. Apenas para ver sua
própria solidão tomar conta de tudo e imperar soberana. Não tinha mais medo de
encará-la. Ao contrário, tornaram-se bons companheiros.
Parou
na entrada da garagem e, enquanto aguardava que o porteiro lhe abrisse o
portão, ouviu a voz inconfundível:
-
Feliz Natal pai. Vamos passar juntos?
Era
seu filho.
Edmir Saint-Clair
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