Quando em 2009 o escritor inglês Richard Dawkins fez sucesso na Flip falando mal das religiões, foi muito solicitado para explicar a inexistência de Deus, na qual, como bom ateu, acreditava religiosamente. Hoje, se estivesse vivo, seria chamado para comentar a frase “menos Luíza, que está no Canadá”, bordão que se propagou na internet como se fosse um vírus. Eu disse bordão? Desculpem, queria dizer meme, o termo da moda lançado em 1976 por Dawkins no seu livro “O gene egoísta”. Equivalente cultural de gene, o meme é capaz de se replicar, passar de uma mente para outra e se disseminar de maneira viral. Como esclarecia o autor, pode ser uma melodia, uma ideia, um poema, um comportamento ou, acrescento, uma irrelevância, como a afirmação “hoje é dia de rock, bebê”, da Cristiane Torloni, ou a aderência inevitável do “Ai, se eu te pego”.
O que aconteceu com o meme Luíza foi mais impressionante, porque surgiu na Paraíba e se espalhou pelo país. Num anúncio imobiliário, um suposto comprador, depois de exaltar os apartamentos à venda, diz: “É por isso que fiz questão de reunir toda a minha família (ao fundo, a mulher e um casal de filhos), menos Luíza, que está no Canadá, para recomendar esse empreendimento.” Pronto, e a moça de 17 anos virou celebridade instantânea. Retornou ao país, deu dezenas de entrevistas, criou um blog sobre moda e, segundo a agência que agora cuida de sua imagem, vai se “posicionar como a formadora de opinião que ela tem potencial para ser”. O último feito da jovem foi ser questão numa prova de concurso público no interior de SP.
O “caso Luíza” ilustra o fenômeno de consagração da insignificância em que se transformou o meme no Brasil. Assim como uma bobagem replicada pode virar notícia, assim também um desacontecimento surge como fato relevante, um brother do BBB pode amanhecer famoso, sem quê nem por quê, ou uma mentira política às vezes ganha ares de verdade. Basta que, jogados na rede, sejam repetidos ou tuitados à exaustão. Como dizia McLuhan nos anos 60, “o meio é a mensagem”, ou seja, mais do que a forma e o conteúdo, o que importa é o modo como ela é divulgada.
No processo de comunicação de massa, a transmissão é tão ou mais importante do que a emissão e a recepção. O meme sempre existiu, com outros nomes — bordão, palavras de ordem, slogans — mas nem sempre para transmitir irrelevâncias. Ao contrário. O mais antigo deles, o “Faça-se a luz” (“Fiat lux”), não caiu na boca do povo porque não havia internet. Pouco antes de morrer, José Saramago diagnosticou a “tendência atual para o monossílabo” como forma de comunicação. Ele se referia ao twitter, mas, exagerando, pode-se estender o fenômeno ao meme. A sua previsão é de um pessimismo hilário: “De degrau em degrau, vamos descendo até o grunhido.”