"Demorava-se o mínimo indispensável
com cada um"
com cada um"
Ela se achava feia, odiava a pequena cidade do Arkansas, onde nasceu, tinha fome de ascensão. Helen Gurley Brown, editora da revista Cosmopolitan, uma das mulheres mais importantes da imprensa americana, morreu semana passada, aos 90 anos. Suspeito que ainda usasse perucas e tenho certeza de que continuava pensando em sexo.
Eu a conheci em 1981. Trabalhando na revista Nova, havia ganho um prêmio que me levou, junto com a editora de Nova, Fátima Ali, para um encontro de editoras internacionais de Cosmopolitan, em Nova York. Durante uma semana, Helen nos acolheu e conduziu.
Uma mulher de método, e vontade férrea. Assim ela era, debaixo do amplo sorriso profissional. Magérrima, durante infindáveis anos seu almoço na redação limitou-se a um iogurte e uma lata de atum. Dizia estar acima do seu peso ideal. Trabalhava o tempo todo, mesmo quando fingia divertir-se. Nos restaurantes elegantíssimos onde nos levou, nos encontros que tivemos com outras pessoas, seu olhar não estava a passeio mas à caça, atento e móvel, sempre dirigido para o objeto que mais valesse a pena.
Profissional em tudo. Eu a vi chegar ao trabalho, como fazia todos os dias, portando uma sacola de papelão daquelas de butique. Continha o necessário para enfrentar o evento da noite. Findo o expediente, ela abria o espelho de três faces estrategicamente colocado no seu escritório, retirava da sacola um aplique ou peruca, um par de sapatos de salto bem alto, um casaquinho elegante, alguma bijuteria vistosa. E, armada de maquiagens e pentes, refazia a imagem. No evento, não bebia álcool, pedia água com gelo e uma fatia de limão, e mantinha o copo na mão, para não destoar. Demorava-se o mínimo indispensável com cada um. Considerava que agradar era sua tarefa e procurava sempre algo que pudesse elogiar. Eu a vi, anos mais tarde, quando veio ao Rio, aproximar-se de José Lewgoy em um coquetel no Copa e chegando a ele descalçar rapidamente os sapatos, para não ultrapassá-lo em altura. Circulando de um a outro, sua presença não durava mais de meia hora. Tinha pressa de chegar em casa, levava trabalho para fazer.
Audácia e sexo foram a alavanca do seu sucesso. Quando em 1962 lançou seu primeiro livro, Sex and the single girl, a América conservadora estremeceu e o escândalo transformou o livro em best-seller. Helen entendeu o recado. Chamada para editar a então morna e doméstica revista Cosmopolitan, surpreendeu as donas de casa tascando na capa uma loura decotada e chamadas de sexo. As vendas garantiram seu cargo nos 32 anos seguintes.
As ideias de Helen sobre sexo estão longe de ser unanimidade. Pragmática em tudo, aconselhava utilizar o sexo não apenas para diversão, mas para subir na vida – há sempre um chefe generoso no caminho de uma funcionária. Ela própria o fez e o contou em livro de memórias. Dizia que vale a pena não almoçar, para comprar um terninho de grife bem acima das próprias posses. Haverá no elevador um executivo importante que se perguntará que mulher é aquela, tão poderosa, que ele não conhece. O mesmo em relação a carro. E o comprovava: saindo de um superautomóvel, chamou a atenção de David Brown, – mais tarde importante produtor de Hollywood – que se casou com ela e com ela viveu pelo resto da vida.