Tenho em casa alguns bilhetes do metrô de Paris. E de que me servem eles, se alguns milhares de quilômetros me separam da estação mais próxima? Há um oceano entre nós e seria necessária uma despesa enorme para comprar passagem de ida e volta, enfrentar aeroportos e me hospedar em hotéis habitados por ratos. Minhas gavetas, tenho de confessar, ao lado de preciosidades, abrigam muita inutilidade.
São papéis que guardo para ler e resolver mais tarde. O tempo se encarrega de torná-los desnecessários. Mas a preservação da memória política ou familiar solicita que sejamos avaros na destruição dos quase documentos. Chega um dia em que me disponho a organizar o que para o outros é bagunça, mas que entendo. Encho sacos de lixo, mas sempre sobra mais um tanto de fotos, rabiscos, pastas. Alguma coisa ainda merece ficar entre os meus guardados. Pois na próxima volta à limpeza, sempre pode surgir uma surpresa agradável.
Sou da geração do papel e não domino todas as técnicas de gravar para o mundo digital o que vivi. Faço o simples e vou levando a existência com conforto e tranquilidade. Os textos, as canções e muito mais estão garantidos em computador, pen-drive e também em cadernos manuscritos que faço questão de ter comigo.
Fotos perdi o desejo de tirar desde que minhas meninas cresceram e fui tomando preguiça do vício fotográfico dos turistas, principalmente japoneses, que nada aproveitam das viagens e, penso, só vão curti-las na volta ao lar ao projetar o que retrataram, mas não viram. Hoje não são apenas eles, a praga é mundial.
Depois da chegada dos celulares, ninguém presta atenção em nada. Nos shows, a música não tem a menor importância. O barato total é se postar, de costas, diante do cantor e registrar aquele momento de protagonismo.
Recebi pelo correio uma canção de um compositor carioca gravada em cassete. Se não fosse prevenido não teria condições ouvi-la.
Aí entro num terreno que aprecio. Ao contrário da maioria das pessoas, conservei todos os vinis que tinha. Precavido, lembro-me que fui a uma loja de aparelhos sonoros e comprei uma dúzia de agulhas. Desconfiado, julguei que, em pouco tempo, isso não seria mais encontrado no mercado. Fiz mais: comprei um aparelho que toca e grava cassetes, vinis e CDs. E adquiri um aparelho dos antigos, mas profissional, para ouvir com qualidade as músicas que quero.
E agora que, parece, o vinil está voltando e com alta qualidade, no mundo inteiro, eu poderei ter os que não tenho e, também, causar inveja naqueles que, seguindo a moda do dia, abriram mãos de seus bolachões.
Contemplo minha estante de LPs e me orgulho do fato de não ter caído na catastrofismo dos que acreditaram e acreditam no que todas as modas e ondas indicam.
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