Seria uma cópia digital da mente de
uma pessoa em um portador não biológico - uma versão de uma pessoa
integralmente senciente, que poderia viver por centenas ou milhares
de anos.
No entanto, Istkov conseguiu a
atenção e, em alguns casos, o apoio entusiasmado de figuras
altamente respeitadas da Universidade Harvard e do Massachusetts
Institute of Technology (MIT), além de líderes em campos como a
genética molecular e as neuropróteses. Cerca de 30 palestrantes
dessas e de outras disciplinas vão participar da segunda edição
anual do Congresso sobre o Futuro Global 2045, marcado para 15 e 16
de junho no Lincoln Center, em Manhattan.
Os participantes ouvirão pessoas
como Roger Penrose, professor emérito de física matemática na
Universidade Oxford que pode ser visto no site 2045.com com uma
videochamada sobre a "natureza quântica da consciência",
e George M. Church, professor de genética na Escola Médica de
Harvard, cujo vídeo no site é sobre "a extensão da gama de
saúde cerebral". Como esses vídeos sugerem, cientistas dão
passos pequenos e constantes em direção à fusão humano-máquina.
O futurista Ray Kurzweil, hoje diretor de engenharia do Google,
argumentou no livro "The Singularity is Near", de 2005, que
a tecnologia avança exponencialmente e que "a vida humana será
transformada irreversivelmente", a tal ponto que não haverá
diferença entre "o humano e a máquina ou entre a realidade
física e a realidade virtual".
Os avanços tecnológicos não
pararam desde que Kurzweil escreveu o livro --como a criação de
computadores capazes de derrotar humanos em partidas (como Watson, da
IBM, vencedor do programa "Jeopardy"), até uma tecnologia
que monitora as batidas do coração de jogadores de games e
possivelmente seu grau de excitação (é o caso do novo Kinect),
passando por ferramentas digitais para portadores de deficiências
(como implantes cerebrais que podem ajudar tetraplégicos a
movimentar braços robóticos).
Acadêmicos parecem enxergar Istkov
como alguém sincero e bem-intencionado. Eles consideram que, se ele
quer liderar a torcida global em favor de áreas em que cientistas
geralmente trabalham na obscuridade, ótimo. Pergunte a participantes
na conferência 2045 se os sonhos de Istkov poderão virar realidade
algum dia. Você ouvirá desde um "pode ser" até frases de
grande entusiasmo.
"Sou contra dizer que alguma
coisa é impossível, a não ser que ela viole as leis da física",
responde o professor Church, acrescentando, a respeito de Istkov: "Só
acho que seus planos contêm muitos pontos sem linhas que os
interliguem. Não constituem um mapa do caminho real."
"Isso não é mais improvável
do que o que se viu no início dos anos 1960 com a chegada dos
transplantes de fígado e rins", opinou Martine A. Rothblatt,
fundadora da United Therapeutics, empresas de biotecnologia que
fabrica produtos cardiovasculares. "Na época, as pessoas
acharam que era uma maluquice total. Hoje cerca de 400 pessoas fazem
esses transplantes por dia."
Istkov diz que vai investir pelo
menos parte de sua fortuna em qualquer start-up que promova sua visão
-ele afirma que, até agora, já gastou US$ 3 milhões de seu próprio
dinheiro-, mas seu objetivo principal com o projeto 2045 não é
enriquecer. Ele acha que seus avatares não apenas podem acabar com a
fome mundial -porque uma máquina precisa de manutenção, não de
comida-, mas também inaugurar uma era mais pacífica e
espiritualizada.
"Precisamos mostrar que estamos
aqui para salvar vidas", explicou. "Para ajudar os
deficientes, curar doenças e criar a tecnologia que nos permita, no
futuro, responder a algumas questões existenciais. Como, por
exemplo, o que é o cérebro, o que é a vida, o que é a consciência
e, finalmente, o que é o Universo."
Istkov passou sua infância em
Bryansk, cidade situada a 370 km a sudoeste de Moscou. Seu pai era
diretor de teatro musical e sua mãe professora primária. Ele
estudou na Academia Russa Plekhanov de Economia, onde conheceu seu
futuro sócio comercial, Konstantin Rykov. Em 1998, Rykov fundou uma
e-zine cujo título era um palavrão em inglês. Istkov começou a
trabalhar na e-zine no ano seguinte. Eles criaram o tarakan.ru, blog
sobre a internet russa, e um jornal on-line, o Dni.ru. Seguiram-se
sites de games e outros jornais on-line, além de uma revista
impressa, uma editora de livros e um canal de televisão na internet.
Aos 25 anos de idade, Istkov começou
a apresentar os sintomas de uma crise de meia-idade. Ele previu as
coisas que poderia lamentar quando chegasse à velhice: os
instrumentos musicais que não teria aprendido a tocar e os livros
que não teria lido. De repente, o tempo de vida médio de cerca de
80 anos lhe pareceu muito pouco. Quanto mais contemplava o mundo,
mais lhe parecia que tudo estava errado.
"Olhe para isto",
explicou, abrindo seu laptop e começando a exibir slides com uma
estatística dolorosa após outra: quase 1 bilhão de pessoas no
mundo estão passando fome. Quarenta e nove países estão envolvidos
em conflitos militares. Dez por cento das pessoas no mundo têm
deficiências físicas. E assim por diante.
Istkov calcula que precisamos mudar
nosso modo de pensar ou dar às nossas mentes a chance de "evoluír".
Para que isso possa acontecer, porém, precisamos de um novo
paradigma do que significa ser humano. Isso requer uma transição
para um mundo em que a maioria das pessoas não seja obrigada a se
dedicar às questões básicas da sobrevivência.
Assim surgiu a ideia dos avatares.
As leis da oferta e da demanda continuam presentes na utopia de
Istkov. Ele presume que, a partir do momento em que a produção de
avatares crescer, o custo deles cairá. Também prevê que as
organizações humanitárias, que hoje se dedicam a alimentar, vestir
e curar os pobres, passarão a se dedicar à meta de fabricar e
distribuir corpos saudáveis, ou seja, máquinas.
Por enquanto, a simples aquisição
de uma cabeça robótica com aparência natural já custa muito. Algo
que Istkov descreve como a cabeça mecânica mais sofisticada da
história -uma réplica do próprio Istkov do pescoço para cima-
está sendo construído em Plano, no Texas, sede da Hanson Robotics.
A empresa foi fundada por David Hanson, doutor em artes e engenharia
interativas.
"A maioria das cabeças
robóticas tem 20 motores", comentou Hansen. "As minhas
possuem 32. Esta terá 36. Assim, mais expressões faciais, simulando
todos os principais grupos de músculos."
A expectativa ainda mais
surpreendente é que, enquanto Istkov estiver em outra sala, sentado
diante de uma tela com sensores para captar cada movimento seu, a
cabeça será capaz de reproduzir suas expressões e sua voz. "Ele
está controlando o robô e controlando seus gestos, sua expressão e
sua fala com sua voz, em tempo real", diz Hanson.
Istkov vê sua iniciativa futurista
como uma finalidade em si mesma para hoje. "Nossos líderes
buscam a estabilidade", declarou. "Não temos algo que una
a humanidade inteira. Essa iniciativa vai inspirar as pessoas."
Será que as pessoas querem
realmente viver para sempre? Se sim, gostariam de passar essa
eternidade num "portador não biológico"? O que acontecerá
com o cérebro de uma pessoa depois que ele for descarregado no robô?
E com seu corpo? Se você pudesse escolher quando adquirir um corpo
avatar, qual seria a idade ideal para fazê-lo? Avatares podem
transar?
Essas são apenas algumas das
dezenas de perguntas levantadas pela Iniciativa 2045. Por sinal,
Istkov diz que avatares podem fazer sexo, sim, porque "um corpo
artificial pode ser projetado para receber qualquer tipo de
sensação".
Se ele atingir seu objetivo, ficará
na história como o visionário arrojado cujo dinheiro e garra
redefiniram a vida e encontraram soluções para alguns dos problemas
mais renitentes do mundo. Se fracassar, a palavra "tresloucado"
com certeza figurará em seu obituário.
David
Segal "New York Times”
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