‘Ele
costumava brincar dizendo que preferia
alguémsem caráter do que
sem humor’,
conta Gilda Mattoso sobre Vinicius
O
Museu da Imagem e do Som promoveu esta semana o seminário “Vinicius
centenário”, reunindo durante um dia, em três mesas, 13 pessoas
que tiveram alguma ligação com o homenageado ou com sua obra. Só
assim pôde contemplar os vários aspectos dessa figura plural —
tão plural que o cronista Sérgio Porto apresentava como “prova”
o fato de que, se ele fosse apenas um, não se chamaria Vinicius de
Moraes, mas de Moral. Os debates abordaram Vinicius como poeta, como
músico e como homem do mundo. Participei desta última como mediador
dos convidados Miguel Faria Jr, autor do magnífico documentário
sobre o amigo; Marcos Azambuja, diplomata como seu colega de
Itamarati, com quem conviveu em Paris; e Gilda Mattoso, a última
paixão do poeta.
O que ficou de melhor desse convívio? Se pudessem
resumir, coisa impossível, o que ainda sentem em relação a um
personagem tão rico, os três convergiriam para um ponto comum: a
irrestrita admiração. Gilda destaca do ex-marido a generosidade e o
bom humor: “Ele costumava brincar dizendo que preferia alguém sem
caráter do que sem humor.” Miguel, que foi casado com Susana de
Moraes, ressalta no ex-sogro a capacidade de se reinventar: “E,
sempre patrulhado, eram transformações sofridas.”
A Azambuja, o
que mais impressionava era a modéstia com que Vinicius procurava se
mostrar menor do que era: “Ele camuflava sua cultura.” Isso
ajudava a alimentar uma certa visão folclórica que fazia do
poetinha um poeta menor, ele que é um dos mais refinados sonetistas
da língua poética de Camões.
Sua
aventura existencial foi tão excitante, com suas libações
etílicas, seu desprezo à solenidade, sua ampla liberdade
sentimental, seus nove casamentos e sua renovada disposição de se
apaixonar, que não raro fez sombra à sua arte. Carlos Drummond de
Andrade me confessou numa entrevista de 1980 que invejava no colega a
independência de espírito e a falta de compromisso com as
convenções sociais: “Ele fazia o que queria e sempre com aquela
doçura, aquela capacidade de encantar que fazia com que as donas de
casa mais severas o adorassem.”
De
fato, além das lições de poesia e de música, ficaram dele as de
vida, do carpe diem, do aqui e agora. Seu ensinamento está contido
em três versos:
“E
a coisa mais divina
Que
há no mundo
É
viver cada segundo.”
Houve
quem não tivesse entendido o que publiquei na coluna passada, quando
afirmei que a polêmica das biografias já tinha dado o que tinha que
dar, e que agora era esperar a decisão da Justiça. O que eu quis
dizer é que nessa altura, com tanta polarização, ninguém convence
ninguém que já não esteja convencido, mesmo os mais próximos.
Será que Ana de Holanda convencerá o irmão Chico a mudar de
posição, com o argumento de que afinal seu pai — o pai dos dois —
era historiador?