Qualquer
assunto ou pessoa que vá ao ar tem logo dois lados
trocando insultos
e acusações, dividindo o que poderia ser multiplicado
O
avô do Jabor era uma figuraça. Quando o neto lhe contava
entusiasmado uma boa novidade, o velho logo o advertia: “Cuidado,
Arnaldinho, nada é só bom.” Sim, tudo também tem um lado ruim, o
das coisas boas que vão ter fim. A máxima do velho antecipava o
irônico paradoxo da era digital: nunca na história deste planeta
houve algo tão bom para aproximar as pessoas — e nada que as
dividisse tanto — como a internet, onde todos se encontram e cada
um pode mostrar, escondido pelo anonimato, o seu pior.
Chico
Buarque, que um dia já foi chamado de maior unanimidade do Brasil,
disse que sempre acreditou que era amado, até descobrir, na
internet, que era odiado. Qualquer assunto ou pessoa que vá ao ar
tem logo dois lados trocando insultos e acusações, dividindo o que
poderia ser multiplicado. No pesadelo futurista, a diversidade e a
diferença são soterradas pela ignorância e o ódio irracional, que
impedem qualquer debate produtivo, assim como os black blocks impedem
qualquer manifestação pacifica.
Na
última semana li vários editoriais de jornais e artigos de diversas
tendências sobre o mesmo tema: a internet como geradora e ampliadora
de um virulento e empobrecedor Fla x Flu, ou pior, de um PT x PSDB em
que todos saem perdedores. E como disse o Pedro Dória: só vai
piorar. Todas as paixões e excessos que são permitidos, e até
divertidos e catárticos, nas discussões de futebol só produzem
discórdia, mentiras e mais intolerância no debate politico e
cultural. Simpatizantes de qualquer causa ou ideologia só leem os
que dizem o que eles querem ouvir, nada aprendem de novo, chovem no
molhado.
Mas
até esse lado ruim também tem um lado bom, de revelar as verdades
secretas, expondo os piores sentimentos de homens e mulheres, suas
invejas e ressentimentos, sua malignidade, que nenhum regime político
pode resolver. Sem o crescimento da consciência individual, como
melhorar coletivamente?
Como
Freud explicaria no seu Facebook, os comentários odiosos revelam
mais sobre quem comenta do que sobre o odiado. Ou, como já dizia a
minha avó, a boca fala (e agora digita) as abundâncias do coração.