‘‘Os sul-americanos vibram com nosso jeito, nossa onda, nossa maneira de viver. A expansão e exportação do ‘abraço’ deveria ser nossa principal meta internacional. É o que sabemos fazer melhor entre nós’’.
Uma das maiores virtudes do brasileiro é admirar suas muitas diferenças internas. Territorialmente vasto e com uma cultura que se mistura em todos os níveis, aprendemos a nos orgulhar de nossa diversidade. Abraçamos nossos sotaques, nossa culinária, nossas artes, raças, religiões e nossa música. Tudo tão variado e vivo. Ser múltiplo é nossa singularidade. Amamos nosso país plural: os Brasis!
Aqui o samba, o baião, o frevo, o xote, o maracatu, o forró e o xaxado se misturam com rock, pop, funk, blues, soul, eletrônica e batidão numa sinergia natural e constante.
No momento em que o planeta inteiro se conecta pelas redes sociais e começa a exercitar a beleza das diferenças, o Brasil já se apresenta globalizado em si, consequência da miscigenação e multiculturalidade. Nenhum outro país no mundo tem essa particularidade, o que coloca o Brasil à frente desse novo paradigma mundial: “Tudo ao mesmo tempo agora.” Descendemos de portugueses, espanhóis, holandeses, italianos, asiáticos, alemães, poloneses, africanos, indígenas. O Brasil é o mundo condensado e conectado. Nos alimentamos das diferenças e somos consequência delas.
Assim somos vistos pelo mundo afora: todos sabem da alegria resultante de nossos encontros e misturas, mas… como nós olhamos para fora? Por que, de um certo ponto de vista, ainda focamos nosso olhar para os europeus e americanos? Por que nos espelhamos só neles e somos tão fechados para a América do Sul e sua língua? O espanhol é tão parecido com o português. E o povo sul-americano se assemelha muito ao nosso. O fato é que os chamamos de hermanos, mas não formamos uma família realmente.
Esses “primos distantes” admiram nossa variedade de Brasis, mas nós sequer os observamos. De onde exatamente surgiu nosso preconceito, que nos deixa cegos e surdos às belezas sulamericanas? Talvez por uma acirrada rivalidade futebolística, pelas novelas produzidas por lá, pelas mercadorias do Paraguai ou até mesmo pelo rancor de ver Búzios frequentada por argentinos. Tolices que não justificam a perda que sofremos em excluí-los. Digo “perda” porque às vezes me parece que nós não nos consideramos sul-americanos. Somos brasileiros e só. Já nos basta. Somos autossuficientes e não precisamos nos misturar com eles. Pensando assim, perdemos a oportunidade de ter uma América do Sul integrada e misturada, como fazemos aqui.
Será que, justamente por termos esse poder de admirar as diferenças e de fazer com que todas as nossas culturas se combinem, não seríamos nós quem deveríamos abraçá-los? Será que esse movimento não deveria partir daqui? Os sulamericanos vibram com nosso jeito, nossa onda, nossa maneira de viver. Querem ser incluídos na alegria da nossa mistura. Rivalidade e preconceito se desdobram em mais rivalidades e preconceitos. O que se planta se colhe. A expansão e exportação do “abraço” deveria ser nossa principal meta internacional. É o que sabemos fazer melhor entre nós. Sonho com um portuñol ético que nos coloque definitivamente na América do Sul e que nos inclua ao mesmo tempo em que a incluímos.
Sonho com o encontro de nossas músicas, de nossas línguas, nossa poesia, nossos sentidos, nossa gente. Precisamos redescobrir a América Mãe. Celebrar uma “sul-americanização” brasileira aliada a um “abrasileiramento” dos países sul-americanos.
No passado, o Brasil foi chamado de “o país do futuro”, mas o futuro chegou e agora nós somos “o país do presente”. E que presente daremos aos hermanos e à América do Sul?
Eu proponho um abraço.