Minha colega Andréa
Beltrão é uma nadadora exímia. Três mil metros era o mínimo que
cumpria nas piscinas. Agora que se mudou para Copacabana, descobriu o
nado em mar aberto.
Eu já invejava a sua
disposição de acordar às 8 e se jogar na água gelada do Rio de
Janeiro. Mas a notícia de que a Princesinha do Mar é a praia mais
limpa da cidade agravou a frustração de não ter o espírito
guerreiro da minha companheira.
Cardumes gigantes
acompanham a travessia, diz ela, e tartarugas, e peixes, e barcos. Um
dia eu chego lá.
Eu tinha 10 anos quando
o filme Tubarão acabou com o meu prazer de entrar na água. Assim
como milhões de espectadores impressionados com o tum, tum, tum, tum
da tela, era sentir o pezinho boiando para ser assolada pela sensação
de que a bocarra iria me partir ao meio.
Eu ia muito a Itaipu
com o meu pai para pescar. Ele ficava em um bote — acho que nunca
fisgou um peixe — enquanto eu punha a máscara para olhar as pedras
com uma prima.
Um dia, vi uma
tartaruga pequena, desesperada, agarrada a uma rede de pesca. Em vez
de ajudar, abandonei a coitada à própria sorte e fugi panicada.
Culpa do Spielberg.
Fernando de Noronha me
curou da síndrome do Tubarão. Cheguei a abraçar uns lixas de
noite, munida de colete e garrafa, descobri a curiosidade amigável
dos seres marinhos e o silêncio das profundezas.
Um amigo mais audaz foi
parar em Rangiroa, na Polinésia Francesa. O pacote de mergulho
incluía um passeio na Cave de le Rocan. A caverna dos tubarões se
encontra a 30 metros da superfície e, em caso de pânico, não é
possível pular fora ligeirinho, tem de parar na descompressão.
Os turistas
mergulhadores desceram na boca do atol, onde os mastodontes famintos
aguardavam a saída dos peixes. Agarradas ao recife, em meio à
correnteza, as pessoas viram o guia retirar uma carcaça suculenta de
dentro de um saco e soltá-la perto dos visitantes.
Sugado pela corrente,
um pedaço considerável de carne se aninhou no peito do meu amigo.
Desespero total.
As mandíbulas
disputavam nacos a um palmo do rosto dele. Aqueles momentos em que a
gente se pergunta o porquê de ter saído de casa. Mas ele viveu para
contar — isso é o que vale.
Conheço outro que
comemorou os 50 anos em uma gaiola, rodeado de tubarões-brancos na
África do Sul. Tem seu estilo.
O problema é que eu
nasci covarde. Passei uns vinte anos lutando contra a covardia, até
que desisti; foi depois que
tive filhos.
Tenho uma esteira em
casa, onde corro como um rato adestrado, e uma cama de pilates. De
vez em quando, dou a volta na Lagoa. As aulas ainda são cascudas,
mas já me encaminho para a maturidade. Não luto mais para ser
destemida.
Para os que não têm o
fôlego de campeã da minha colega, e mesmo para os que o têm,
depois do sagrado banho salgado de domingo, vale a visita à Casa
Daros. O restaurante é excelente, a reforma, de cair o queixo e a
exposição Le Parc Lumière, de tirar o fôlego. O penetrável do
pátio, de Hugo Richard e Natali Tubenchlak, faz teu filho te
agradecer por tê-lo arrastado para um museu, mas aconselho ir de
manhã ou bem no fim da tarde, porque lá dentro esquenta.