Tinha acabado de chegar de São Paulo e precisava ir do aeroporto Santos Dumont ao Leblon. O ônibus especial estava prestes a sair e a fila estava bem grande e atrás de mim cresceu mais ainda. Lógico que TODOS embarcaram o que resultou em muitos passageiros em pé. Sentei-me e logo passou por mim uma mulher grávida. Óbvio que cedi o lugar.
O que me chamou a atenção é que não fui o único nem o primeiro a ter essa atitude naquele mesmo ônibus. Pessoas que estavam ou não em poltronas preferenciais ofereceram seus lugares aos de direito ou por pura delicadeza. Percebi ali que certas gentilezas estão sendo recuperadas no nosso dia a dia, mesmo em cidades grandes como o Rio.
Há alguns anos havia mais gentileza no trato entre as pessoas. Na década de 1970 era comum ceder-se o lugar na fila para os mais velhos, gestantes e mulheres em geral, simplesmente por gentileza. Não precisava de lei para que isso acontecesse. Era normal carregarmos as sacolas de compras da mãe de qualquer amigo até a casa dela, caso cruzássemos com alguma pelas ruas do Leblon.
Na década de 1980 a realidade se inverteu completamente. Era a cultura do "levar vantagem em tudo”, onde ninguém levou vantagem em nada e o Brasil todo perdeu muito. Ninguém cedia lugar para ninguém em lugar nenhum. As grávidas, às vezes, ainda davam sorte. E começava ali o declínio ético e moral que levaria nosso país a calamitosa situação atual.
A lei que obriga os bancos e locais de atendimento ao público a ter um local exclusivo para preferenciais teve que obrigar todos a serem bem educados e a agirem de uma forma que deveria ser espontânea. É triste nosso país ser um lugar onde tenha que existir uma lei para algo tão básico.
Hoje, parece que a sociedade já incorporou essa atitude simples. A lei surtiu efeito educativo e se estendeu a outros setores da vida cotidiana. É claro que isso não aconteceria sem a internet e a força das mídias sociais.
Estamos redescobrindo o valor de coisas simples como a gentileza e a solidariedade. Estamos resgatando nossas raízes.
Ser o país que queremos vai requerer décadas de um trabalho silencioso e ininterrupto; o de cada cidadão consigo mesmo.
O brasileiro está praticando a autocrítica como nunca havia feito antes.
Já temos a consciência da culpa nossa de cada dia. Da corrupção moral que contaminou todos os níveis da convivência humana em nosso país.
Hoje, quem fura fila é vaiado. Quem antes comprava ingresso para o teatro com carteira de estudante falsa, hoje pensa muitas vezes antes. Essas malandragens agora são vistas como o que são em sua essência: desonestidade.
Voltou a ser feio fazer isso.
Parece que, apesar da descoberta desse oceano de lama que nos engole diariamente, estamos começando a nos reconstruir como sociedade. Estamos resgatando nossos valores éticos fundamentais.
Essa tendência está crescendo e se disseminando a cada dia.
No mundo virtual já está a pleno vapor e espero que invada cada vez mais o nosso mundo real.
Afinal, sonho que se sonha junto vira realidade.
Afinal, sonho que se sonha junto vira realidade.
Pelo menos é o que dizem.