Com ressonância magnética de alta resolução, cientistas fizeram imagens sem precedentes das fibras nervosas. Para surpresa geral, a estrutura das vias cerebrais é relativamente simples, como uma “cidade planejada”.
O mapeamento por ressonância magnética mais preciso já feito até hoje em um crânio humano foi capaz de enxergar as fibras nervosas por onde os neurônios transmitem seus impulsos de um canto para outro do cérebro. Aquilo que poderia ser um emaranhado de alta complexidade, porém, revelou-se algo altamente organizado.
É como se, em vez das vielas e ladeiras do centro de São Paulo, o cérebro tivesse avenidas planejadas, como as de Brasília, por exemplo.
Em um estudo publicado na revista "Science", cientistas descrevem pela primeira vez a estrutura que viram no cérebro de humanos e de algumas espécies de macacos. Os padrões humano e símio eram muito similares.
A máquina que permitiu enxergar detalhes da ordem de um milímetro dentro do cérebro (uma resolução dez vezes melhor que a de equipamentos de um bom hospital) foi produzida por cientistas do Hospital Geral de Massachusetts em conjunto com a empresa alemã Siemens. A tecnologia usada foi um aprimoramento de um tipo de ressonância magnética.
O estudo sobre os primeiros resultados obtidos com a nova tecnologia foi liderado por Van Wedeen, cientista da Escola Médica de Harvard. Segundo ele, o fato de as fibras cerebrais se organizarem de modo relativamente simples não significa que não haja um padrão complexo nas conexões entre neurônios. Essas células individuais, porém, ainda não podem ser vistas por uma técnica não invasiva como a ressonância.
"A real conectividade é mais complexa do que a grade de fibras que estamos vendo agora, mas não sabemos o quão mais complexa", disse o pesquisador.
Uma boa parte do dinheiro para a pesquisa saiu do Programa Conectoma Humano, cujo objetivo é criar tecnologias de imagem cerebral não invasivas e capazes de enxergar padrões cerebrais úteis para a psiquiatria. Não é uma tarefa simples, e ainda está longe de se mostrar viável, reconhece Wedeen.
"Cientistas com uma boa máquina de ressonância magnética funcional hoje conseguem diferenciar uma população de pessoas deprimidas de uma população de pessoas não deprimidas, mas isso depende de estatística", explica. "Ainda não é possível diferenciar um indivíduo com depressão de um indivíduo sem o transtorno."
Para compensar a imprecisão, o Projeto Conectoma também busca analisar com mais detalhes a estrutura do cérebro humano e relacioná-la com a influência que diferenças no DNA das pessoas exercem sobre o órgão.
Para Wedeen, o projeto é uma aposta "arriscada", porque ninguém sabe se o conhecimento adquirido será confiável o suficiente para uso clínico. Mas o novo trabalho dá um passo nessa direção.
RAFAEL GARCIA