Durante todo o dia, um relógio faz tique-taque no nosso corpo. Ele acorda-nos de manhã e faz com que possamos dormir de noite. Aumenta e diminui a temperatura do nosso organismo e, nas horas certas, regula a produção de insulina e de outros hormônios.
O relógio circadiano influência até os nossos pensamentos e sentimentos. Psicólogos mediram alguns dos efeitos no cérebro pedindo que pessoas fizessem testes cognitivos em horas diferentes do dia.
Constatou-se que o final da manhã é a melhor hora para fazer tarefas como contas aritméticas de cabeça, que exigem a manutenção de várias peças de informação na mente ao mesmo tempo. Mais tarde é a hora de tentar tarefas mais simples, como procurar por uma letra numa página com rabiscos.
Outra pista sobre o relógio nos nossos cérebros vem de pessoas com condições como depressão e transtorno bipolar. Quem tem esses problemas geralmente sente dificuldade para dormir à noite ou sente-se zonzo durante o dia. Algumas pessoas com demência ficam confusas ou agressivas no final do dia.
“Os ciclos de sono e atividade desempenham um papel importante nas doenças psiquiátricas”, afirma Huda Akil, neurocientista da Universidade de Michigan.
Ainda assim, os neurocientistas lutam para entender exatamente como o relógio circadiano afeta as nossas mentes. Afinal, os pesquisadores não podem simplesmente abrir o crânio de um sujeito e monitorizar as suas células cerebrais durante cada período do dia.
Ainda assim, os neurocientistas lutam para entender exatamente como o relógio circadiano afeta as nossas mentes. Afinal, os pesquisadores não podem simplesmente abrir o crânio de um sujeito e monitorizar as suas células cerebrais durante cada período do dia.
Alguns anos atrás, Huda Akil e os seus colegas tiveram uma ideia.
A Universidade da Califórnia em Irvine guarda cérebros doados para a ciência. Alguns dos seus antigos donos morreram de manhã, alguns durante a tarde e outros de noite. Huda e colegas questionavam-se se havia diferenças nos cérebros dependendo da hora do dia em que os seus doadores faleceram.
“Talvez seja uma ideia simples, mas ninguém havia pensado nisso.”
Ela e os seus colegas seleccionaram cérebros de 55 pessoas saudáveis cujas causas de morte foram súbitas, como acidentes de viação. De cada cérebro, os pesquisadores fatiaram tecidos de regiões importantes para a aprendizagem, para a memória e para as emoções.
No momento em que cada um morreu, as suas células cerebrais estavam a produzir proteínas de certos genes. Como os cérebros foram preservados rapidamente, os cientistas ainda podiam medir a atividade desses genes na hora da morte. A maioria dos genes que examinaram não revelou nenhum padrão regular de atividades no curso do dia, mas descobriram que mais de mil deles seguiam um ciclo diário. As pessoas que morreram na mesma hora do dia estavam a produzir os mesmos níveis de proteínas daqueles genes.
Os padrões eram tão consistentes que os genes podiam agir como um marcador de tempo.
“Poderíamos perguntar: ‘A que hora do dia essa pessoa morreu?’, e daria para apontar, após uma hora, o momento real da morte”, diz Huda.
Ela e os seus colegas então fizeram a mesma análise nos cérebros de 34 pessoas que tiveram depressões fortes antes de morrer. Dessa vez, descobriram que o mesmo marcador de tempo estava bastante fora da ordem.
“Era como se as pessoas estivessem no horário do Japão ou da Alemanha”, conta.
Huda e os seus colegas publicaram os resultados em 2013, inspirando pesquisadores na Escola de Medicina da Universidade de Pittsburg a tentar replicá-los.
“Era uma coisa que antes pensávamos que não poderíamos fazer”, explica a neurocientista Collen A. McClung.Collen e a sua equipa fizeram uma versão ampliada do estudo, examinando 146 cérebros recolhidos no programa de doações da universidade.
Os pesquisadores publicaram os seus resultados no The Proceedings of the National Academy of Sciences.
“Era uma coisa que antes pensávamos que não poderíamos fazer”, explica a neurocientista Collen A. McClung.Collen e a sua equipa fizeram uma versão ampliada do estudo, examinando 146 cérebros recolhidos no programa de doações da universidade.
Os pesquisadores publicaram os seus resultados no The Proceedings of the National Academy of Sciences.
“Encontramos ritmos muito consistentes. Realmente parece uma foto de onde o cérebro estava na hora da morte”, afirma Collen. Huda ficou grata que outra equipa de pesquisadores se tenha esforçado para apoiar o seu resultado. “Existe uma série de coincidências que fazem com que acredite que algo realmente está a acontecer ali”, explica ela.
Mas Collen e os seus colegas também fizeram o que ninguém havia tentado; compararam os padrões da expressão genética do cérebro de jovens e velhos e descobriram diferenças intrigantes.
Os cientistas esperavam encontrar pistas para explicar por que o ciclo circadiano das pessoas mudava à medida que elas envelheciam. “Quando envelhecem, os seus ritmos tendem a deteriorar-se e a adiantar-se”, diz Collen.
Ela descobriu que alguns dos genes que estavam ativos nos ciclos diários fortes em pessoas jovens diminuíram naqueles com mais de 60 anos. É possível que alguns idosos parem de produzir as proteínas nos seus cérebros necessárias para manter os ritmos circadianos.
Para sua surpresa, no entanto, os investigadores também descobriram alguns genes que se tornam ativos nos ciclos diários apenas em pessoas de mais idade.
“Parece que o cérebro tenta compensar ligando um relógio extra”, afirma Collen.
Huda imagina que a habilidade do cérebro de forjar um relógio de apoio pode proteger alguns idosos de doenças neurodegenerativas.
“Pode ser a diferença entre a deterioração ou não”, diz ela.