A intimidade consiste em uma adorável sensação de proximidade e cumplicidade com uma pessoa especial: um amigo sincero, um parente, um parceiro sentimental. Ela só se constrói em determinadas condições especiais, sendo que a mais importante delas tem a ver com o modo como se constituiu nosso modo de pensar.
Cada um de nós desenvolveu um jeito de correlacionar as palavras e os pensamentos que é mais original do que pensamos. Apesar de todos falarmos a mesma língua, nem sempre o que dizemos corresponde exatamente ao que o outro ouve; e, o que é o principal, muitas vezes não está em sintonia com aquilo que estava em nossa mente. Ou seja, como cada cérebro é único, não é raro que aquilo que estou escrevendo aqui agora – e que é o fruto de um esforço de transformar em palavras o que se passa em minha mente – não corresponda ao que você, leitor, estará entendendo. Isso não se deve apenas à uma eventual dificuldade minha de me comunicar e sim a diferenças relevantes entre os nossos modos de pensar.
Em contrapartida, há vezes em que o que falamos ou escrevemos parece corresponder exatamente ao que nosso interlocutor entendeu. A sensação é extremamente agradável, uma vez que nos sentimos devidamente entendidos e isso define uma importante afinidade no sistema de pensar, condição indispensável para que se constitua um relacionamento íntimo. Quando ocorre essa comunicação bem sucedida nossa sensação é de aconchego, de não estarmos tão sozinhos nesse mundo.
Ao longo do convívio com alguém cujo modo de pensar é suficiente parecido com o nosso, é claro que podem surgir divergências de pontos de vista e mesmo de atitudes diante das várias condições objetivas da vida de cada um dos que são íntimos.
É indispensável que esse canal fluente e fácil de comunicação não se feche, o que exige certos cuidados muito relevantes. O primeiro deles diz respeito ao modo como colocamos nossas diferenças: o melhor caminho consiste no uso da primeira pessoa do singular e não a terceira pessoa, uma vez ela que pode facilmente provocar a sensação de cobrança, crítica ou acusação.
Se algo me desagrada no outro, posso dizer a ele que “eu fico triste quando acontece isso ou aquilo entre nós” em vez de “não acho que você deveria fazer isso ou aquilo”; ou pior ainda: “não aceito – não admito – que você faça isso ou aquilo”.
Ninguém tem o direito de exigir nada de ninguém, muito menos dos mais íntimos. Temos o direito e mesmo o dever de informá-los sobre os desdobramentos de seus atos: “quando você age dessa ou daquela maneira, isso provoca em mim tantas e tais sensações e emoções”. Se o outro quiser nos agradar certamente tenderá a evitar as condutas que nos entristecem. Se não for esse o caso, cabe a nós decidir se aceitamos ou não o convívio com essa pessoa.
Outro ingrediente que considero fundamental para a continuidade dos relacionamentos baseados em respeito e intimidade é a ausência de críticas.
Quando uma pessoa relevante nos censura, nossa sensação é muito desagradável; e é especialmente ruim se esperávamos algum tipo de compreensão ou alívio de um desconforto que nós mesmos estejamos sentindo por termos cometido algum erro.
Quando esperamos colo e recebemos uma reprimenda, tendemos a nos calar; e não só naquela dada situação específica, mas também em qualquer outra que venha a ser passível de algum tipo de reprimenda.
Um exemplo: se eu contar para o meu parceiro sentimental algo no qual eu tenha falhado – ou algum sonho ou pensamento não muito abonador – eu não gostaria de ouvir algo do tipo “nossa, nunca pensei que você fosse fazer essa bobagem ou ter tal tipo de pensamento”. É claro que da próxima vez que eu fizer algo que possa ser censurável ou pensar algo não tão agradável não mais contarei o que se passou comigo.
Assim, o que mais comumente interrompe a comunicação e impede a intimidade são atitudes críticas e reprovadoras vindas de parceiros cuja aceitação nos é tão importante.
Se ao invés de críticas ouvirmos algo do tipo “você sabe que em uma dada ocasião fiz algo parecido e sei muito bem como é chato errar e imagino como você deva estar se sentindo; mas não se aflija, pois isso logo passa”, é claro que a intimidade cresce e se fortalece.
Em síntese, as boas relações de companheirismo acontecem entre aqueles que possuem modos de ser e de pensar assemelhados, que sejam muito cautelosos ao colocar suas divergências – sempre dando prioridade para a descrição da repercussão das ações do outro sobre si mesmo – e, mais que tudo, entre pessoas que não se arvorem em juízes e que sejam acima de tudo cúmplices.