E não tenha ilusões: diga você o que disser,
contra ou a favor, no final a culpa será sempre sua
Você
quer ser querida pelos amigos, viver sem problemas, ser daquelas
pessoas que são sempre lembradas com alegria e prazer? Em outras
palavras: você quer ser feliz? Simples: esqueça essas manias de
ver, ouvir e, sobretudo, falar, e sua vida passará a ser um mar de
rosas.
Não
ouça; isso mesmo, não ouça, salvo, talvez, um pouco de música,
quando estiver no carro. Quando perceber que estão contando uma
história escabrosa da área política, vá para a janela e olhe para
fora com enorme atenção.
E se o
assunto envolver a vida particular de quem quer que seja -e quanto
mais próxima a pessoa, pior-, seja drástico e finja um mal-estar
súbito. Se tiver que se explicar, diga, no máximo, que é
vagotônico como era o poeta Vinicius, doença que, aliás, já
esteve muito na moda e que ninguém nunca soube muito bem do que se
tratava.
Agora,
o principal: se uma amiga -principalmente se for a que você mais
adora- quiser contar seus problemas pessoais, arranje uma desculpa,
seja ela qual for, para não ouvir: simule uma crise nervosa, diga
coisas desconexas, dê uns gritos, e se for preciso, desmaie, mesmo
que esteja no meio da rua.
Vale
absolutamente tudo para não assumir o papel de confidente, pois vai
acabar sobrando para você -ou estou dizendo alguma novidade?
Bem,
já falamos do primeiro ponto: não ouvir. Agora vamos ao segundo:
não ver.
Quando
for a uma festa, use óculos, daqueles que os bandidos obrigam os
sequestrados a usar -com vidro negro e opaco- para não enxergar;
faça essa riquíssima experiência que é não ver absolutamente
nada, a saber: quem deu um amasso em quem, de quem é a perna
enroscada debaixo da mesa que você flagrou quando foi pegar o
isqueiro que caiu no chão, ou as baixarias que costumam acontecer
quando as pessoas se descontraem, digamos assim. E se não conseguir
os tais óculos negros, não tem importância: é só passar a noite
inteira de olhos fechados -ou não sair de casa, claro.
Agora,
o terceiro ponto, muito, mas muito mais importante do que não ver e
não ouvir: não falar.
Nunca
diga nada sobre nenhum assunto, e não dê, jamais, uma só opinião
sobre nada. Se alguém diz que a couve-flor está mais cara, ouça
com o ar mais sério do mundo; se ouvir o contrário, também -e
continue mudo. Não diga nada, não faça nenhuma ponderação, não
emita um único som.
Renuncie
a bancar o inteligente e fique até o sol raiar, se for preciso, de
boca fechada, que é a posição correta na vida, como você já deve
ter aprendido -ou devia.
Se
alguém mencionar a crise política e tiver uma vontade súbita de
dizer alguma coisa, morda a língua e não faça juízo a respeito de
nada: nem sobre a queda -ou a alta- do dólar, nem, sobretudo, sobre
a CPI. Opinião, nem pensar.
O
maior perigo é quando sua maior amiga está passando por uma crise e
pede um conselho.
As
pessoas só querem que se diga o que elas querem ouvir, e há até
quem ache que amigo só existe para dar razão quando não se tem
razão -você não sabia?
E não
tenha ilusões: diga você o que disser, contra ou a favor, no final
a culpa será sempre sua. Aprenda, mesmo que já um pouco tarde, que
a sabedoria da vida é não ver, não ouvir e calar.
O que
significa, na prática, não viver -o que é meio triste,
convenhamos.