Essa
semana, passei pela Lagoa e vi que já estão montando a árvore de
Natal. E aí me dei conta que o ano já está acabando. O ano passou,
mas ainda me lembro da virada do ano vendo os fogos do Morro dos
Macacos como se fosse ontem. Daqui a pouquinho chega outro Reveillon
e eu nem digeri tudo que aconteceu neste ano ainda...
Enquanto
caminhava pela Lagoa pensando sobre o ano que passou, me lembrei de
uma música que pergunta “como se mede um ano?”. Ouvi pela
primeira vez “Seasons of love”, do musical Rent, há pouco tempo
durante a apresentação de um coral com cerca de 70 adolescentes do
ensino médio.
A
canção pergunta como se mede um ano. São 525.600 minutos, mas é
assim que você mede um ano para viver, um ano na vida de um homem ou
uma mulher? Melhor seria medir em copos de café, em risos,
discussões?
Como
iremos medir o ano?
Poderíamos
medir pelo número de pessoas que foram às ruas, em quantidade de
manifestações, na quantidade de cidades onde houve protestos.
Poderíamos medir pela criatividade dos cartazes expressando uma
diversidade de causas, mas muita indignação.
Poderíamos
medir pelo número de pessoas detidas arbitrariamente, pelo número
de dias que os manifestantes estiveram em Bangu. Pelo numero de
pedidos de Habeas Corpus feitos por advogados voluntários para os
manifestantes duramente criminalizados pelo governo.
Poderíamos
medir pelo número de bombas de gás lacrimogêneo usadas para
reprimir os protestos, pelas balas de borracha disparadas pela
polícia, pelas balas de verdade também. Pela arma sônica testada
durante o despejo violento da Aldeia Maracanã.
Poderíamos
medir pelo número de dias que se passaram desde que os filhos de
Amarildo viram seu pai pela última vez, quando ele foi levado por
policiais na Rocinha e nunca mais voltou. Ou talvez pelo número de
pessoas desaparecidas, milhares, anônimas e esquecidas, não
procuradas pela polícia.
Poderíamos
medir pela violência policial, pelo número de registros de “auto
de resistência”, pelo número de policiais denunciados por
envolvimento com grupos de extermínio e milícias, pelo número de
agentes do sistema socioeducativo respondendo processos por tortura.
Poderíamos
medir pelas remoções causadas por grandes obras, pelo valor
ridículo das indenizações oferecidas para os moradores do Largo do
Tanque removidos para abrir espaço para a Transcarioca. Ou talvez
pelo número de casas que receberam a marcação “SMH” nas suas
portas, sinalizando a chegada da Secretaria de Habitação que irá
removê-los.
Poderíamos
medir pelos hectares de terras griladas por fazendeiros, pelos
indígenas e quilombolas ameaçados pelos mesmos fazendeiros. Pelo
número de pessoas mortas em conflito por terra no campo, assim como
Cícero no norte fluminense.
Poderíamos
medir pelo número de pessoas que pediram para entrar no Programa de
Proteção a Defensores de Direitos Humanos porque sua luta por um
mundo mais justo as coloca em risco. Pelo número de ameaças e
atentados que sofreram, pelo tempo eu tiveram que passar fora de casa
devido a essas mesmas ameaças, como os pescadores artesanais de
Magé.
A
maneira como escolhemos medir um ano reflete com que olhos olhamos a
realidade e de que forma queremos contar essa história. A “métrica”
que você usa para fazer o seu balanço anual não é neutra nem
imparcial. Ela diz de que lado você está.
Antes
de embarcar nas compras de Natal ou na euforia dos fogos da virada de
Ano Novo, vale a pena pensar como você mediria este ano.