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ÉTICA MÍNIMA EM 15 MICROLIÇÕES - Márcia Tiburi

1- Ética é teoria que é ação, é pensar que é fazer na intenção de sustentar uma sociedade democrática;

2- Ética é questionamento da moral. Não é crítica abstrata que se contenta em fazer pouco caso do que critica, mas crítica concreta que é sempre autocrítica e superação do criticado na direção de algo melhor;

3- Sou ético quando incluo o outro - seja a pessoa, a sociedade ou a natureza – na minha perspectiva;

4- Sou ético se não me entrego à alienação moral, estética e política;

5- Sou ético quando não tenho medo de desagradar os donos do poder ou seus sacerdotes covardes com minhas interrogações sobre a sociedade, sua moral, estética e política;

6- Sou ético se me pergunto “o que estou fazendo com o outro?”;

7- Sou ético quando reflito sobre o respeito e o pratico;

8- Sou ético quando penso que a responsabilidade é coletiva;

9- Sou ético quando sou sincero com o outro e, antes, comigo mesmo;

10-Sou ético quando não tenho medo de aplicar princípios éticos a mim mesmo. Quando não pratico a corrupção e luto contra ela, pagando o preço da minha própria ação na contramão do estabelecido;

11-Sou ético quando admiro a diferença do outro;

12-Sou ético quando a diferença do outro que me perturba, me serve para minha própria autocrítica;

13-Sou ético quando não imponho meu modo de ver o mundo, mas abro meus valores e princípios ao debate;

14-Sou ético quando combato toda forma de autoritarismo, fascismo e negação da liberdade;

15-Sou ético quando, pensando, vejo-me grão de areia no cosmos, e vejo, além de mim, o tamanho da vida, do mundo, da natureza e, mesmo envenenado da miséria humana, não desisto de viver do melhor modo possível em nome da construção de uma condição mais justa para todos em escala social.
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LEMBRAR É ESSENCIAL - Márcia Tiburi

O homem é o animal que lembra. Podemos dizer isso tendo em conta que não haveria, de um modo geral, a cultura, sem o trabalho da memória. Definir o que é a memória, porém, não é fácil. Os cientistas tentam explicá-la afirmando seu funcionamento físico-químico em nível cerebral. Os historiadores criam suas condições gráficas por meio de documentos e provas, definem, com isso, uma linguagem compreensível sobre o que ela seja: o que podemos chamar de “campo da memória”. Os artistas e escritores tentam invocar seus subterrâneos, aquilo que, mesmo sem sabermos, constitui nosso substrato imagético e simbólico. Mas o que é a memória para cada um de nós que, em tempos de excesso de informação, de estilhaçamento de sentidos, experimenta o fluxo competitivo do cotidiano, a rapidez da vida, como se ela não nos pertencesse? Como fazemos a experiência coletiva e individual da memória? É possível lembrar? Lembrar o quê? Devemos lembrar?
Se esta pergunta é possível, a contrária também tem validade: haverá algo que devamos esquecer?

A memória é um enigma.
Para os antigos gregos Mnemósyne era a deusa da memória, a mãe das nove musas que inspiravam os poetas, os músicos, os bailarinos. Seu simbolismo define que a memória precisa ser criada pelas artes. Numa civilização oral como foi a grega nada mais compreensível do que uma divinização da memória. A memória é a mãe das artes, tanto quanto nelas se reproduz, por meio delas é que mantém sua existência. Por isso, ela presidia a poesia, permitindo ao poeta saber e dizer o que os humanos comuns não sabiam. Que a memória seja mãe das musas significa que a lembrança é a mãe da criatividade. Mas de que lembrança se está tratando?
Para além da mitologia, na filosofia, distinguiam-se dois modos de rememoração: Mneme, espécie de arquivo disponível que se pode acessar a qualquer momento e Anamnese ou a memória que está guardada em cada um e que pode ser recuperada com certo esforço. A primeira envolve um registro consciente, enquanto a segunda manifesta o que há de inconsciente na produção de nossas vidas, ou seja, o que nos constitui sem que tenhamos percebido que nos aconteceu, que se forjou por nossa própria obra.

A memória era a deusa que permitia a conexão com os mortos, com o que já foi, com o que poderia ter sido, com o que, para sempre, não mais nos pertence desde que, com ele, não partilhamos o tempo.

Quando esquecer é uma culpa mal-resolvida
O atual modo de vida, pleno de elementos descartáveis, não privilegia a memória. O que se chama “consumismo” tem relação direta com o abandono e o descaso com a memória. Descarta-se tudo, de objetos de uso doméstico a amigos, de roupas a amores. O projeto ecologista da reciclagem é, de certo modo, um trabalho de memória. Na apressada vida urbana vige a regra de que tudo passa, o encanto pertence apenas à novidade, tudo vira lixo instantaneamente. A fungibilidade, a capacidade de trocar, é universal. Se tudo o que existe deve ser descartado, significa que sua existência não faz muita diferença. Esquecer assim, ou elevar o esquecimento a esta lei, é algo perverso.
Este gesto tem, porém, uma estranha e maléfica compensação. Numa cultura em esquecer é a lei, ressentir é inevitável. O ressentimento é a incapacidade de esquecer, impossibilidade de deixar de lado, de abandonar o verdadeiro lixo, ou, em outros termos, o passado com o que, nele, foi espúrio. Ressentimos porque não somos capazes de ver além, carregamos o sofrimento como gozo, ou seja, como o que, contraditoriamente, nos faz bem.

Por outro lado, o ressentimento é movido pela culpa de ter abandonado algo que, injustiçado, tempos depois, reclama sua volta. O ressentimento é um mal por ser fruto da culpa. A culpa, por sua vez, é como uma doença contagiosa da qual a humanidade inteira foi vítima, e ainda é, enquanto não aprende a compreender e aceitar suas próprias escolhas. A esta capacidade chama-se hoje responsabilidade. Mas mesmo com a responsabilidade é preciso tomar cuidado para que ela não seja um mero disfarce da culpa que ainda não eliminamos. Responsabilidade só é possível quando há solidariedade. Quando nos responsabilizamos não apenas por nossas vidas e atos, mas percebemos que somos apenas parte da vida e que muitas de nossas escolhas são coletivas.

Vantagens da memória e do esquecimento
Nietzsche, filósofo que morreu em 1900, dizia que a memória tinha vantagens e desvantagens na vida. É certo que quem quiser viver bem, quem almejar de algum modo ser feliz, deverá provar o equilíbrio entre lembrar e esquecer. Temos, neste momento, um problema de distinção: o que devemos esquecer, o que devemos lembrar? Na busca de um meio termo, mais vantajoso será guardar o que nos traz bons afetos, ou alegria e descartar o que nos traz maus sentimentos, ou tristezas. Motivos para a infelicidade não faltam a quem quiser olhar para a história humana e a história pessoal. Mas enquanto a memória histórica nos faz bem, pois nos mostra o que se passou para chegarmos até aqui, a memória pessoal faz o mesmo, mas ela só tem sentido se conectada à memória coletiva. Para poder buscar a alegria de viver é preciso olhar para a frente, para o futuro e reinventar a vida a cada dia. É esta invenção do presente que nos dará, no futuro, um passado do qual tenhamos prazer em lembrar. Viver do passado ou no passado, só prejudica o presente no qual, elaboramos o que será amanhã o passado.

Esquecer com criatividade
Diante do trauma, da lembrança que ficou recalcada em substratos profundos de nossa inconsciência, que define o ser e o agir sociedades inteiras, como o que foi vivido em catástrofes como a nazista, a do Vietnã, a da colonização e escravização no Brasil, e tantas que conhecemos nas vidas pessoais e familiares, esquecer torna-se um remédio contra o sofrimento. Mas esquecer não é apagar o que se viveu de modo abstrato, muitas vezes é justamente pela “rememoração” que nos lembramos. Por isso, contar histórias, fazer arte, ou seja, deixar-se levar pelas musas, continua sendo a melhor saída. A vida criativa é a única que evita o mau esquecimento e, por outro lado, a má lembrança que é o ressentimento.
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AMIGOS PARA SEMPRE - Márcia Tiburi

A filosofia, cuja etimologia implica a palavra grega Philia que significa amizade, nasceu da amizade entre os homens que, por sua vez, tinham amizade pela sabedoria. Como o amor, a amizade é uma espécie de desejo, mas um desejo diferente da posse. Quando os filósofos falam da amizade entre seres humanos estão dizendo algo muito parecido ao “desejo de saber”, literalmente melhor traduzido por “amizade pela sabedoria” que anima sua atividade. Amigos não eram aqueles que se reuniam em torno da economia, nem em torno da cosmética, da ginástica, nem em torno da culinária ou da retórica. Que laço era este que unia alguns entre si em nome de algo tão complexo como a sabedoria? Qual a forma da relação a que chamamos até hoje amizade se ela é um desejo sem posse? Quando amamos alguém desejando seu bem sem que este seja o nosso próprio bem?

Pessoas de bem
Sócrates defendia que a amizade só acontecia entre pessoas de bem não ocorrendo entre pessoas más e incapazes de amar o outro. Para seguir este raciocínio socrático precisamos nos perguntar se nos encaixamos na definição de uma “pessoa de bem”. Pensava ele que as pessoas totalmente de bem são auto-suficientes, não se pode dizer delas que “precisem” de amigos. Mas todos precisamos e, somos apenas humanos, não somos deuses auto-suficientes. Por isso, concluirá Sócrates no diálogo Lísis de Platão, que para se ter amigos é preciso ser alguém que sabe o que é o mal, mas deseja o bem. Desejar o bem (a alguém ou à sabedoria) é a definição mais perfeita da amizade. Amigo é, portanto, aquela pessoa na qual se acredita que os bens parciais da vida podem se agregar na realização do Bem - com letra maiúscula - que equivalia ao Bem superior, uma espécie de Bem Geral, Bem de todos, para todos, em relação a tudo o que existe. Como se fosse possível falar de um Bem do Cosmos, uma harmonia total no universo que, mesmo sendo uma utopia, é a idéia que deveria nortear as ações das pessoas de bem.

A amizade é uma virtude
Aristóteles, discípulo de Platão, herdou questões de seus antecessores. Para Aristóteles, a amizade é uma virtude. Sendo virtude ela significa a excelência de algo. O modo mais perfeito em que algo como a relação entre seres humanos pode se dar. Ela é, além disso, o objetivo último da vida moral, aquilo que define o ápice de uma vida corretamente vivida. Saber ser amigo equivale a ser ético. É amigo aquele que realiza em si e junto dos outros a excelência moral, ou seja, ele quer o bem das pessoas que ama.
Como virtude, para Aristóteles, a amizade é tanto necessária quanto desejável. Diz ele em seu principal livro sobre as questões morais - a Ética a Nicômaco - que, mesmo alguém que possuísse todos os bens, não gostaria de viver sem amigos. A amizade será até mesmo superior à justiça: quando as pessoas são amigas não é necessária a justiça, mas havendo a justiça ainda precisaremos da amizade.
Aristóteles fala de formas diferentes de amizades: a acidental comum entre idosos e jovens que precisam de amigos úteis que facilitem pensamentos, ações e os apóiem em suas fragilidades, e da amizade perfeita que é aquela que une os homens de bem e que são semelhantes em suas virtudes. A amizade perfeita é rara e incomum, tanto quanto é raro e incomum. Há certa exclusividade na amizade. Quem leva a sério a amizade costuma dizer que tem poucos amigos. O que não quer dizer que não se possa agradar muitos, ao mesmo tempo, oferecendo-lhes bens e vantagens ou simplesmente coisas úteis e agradáveis. Um amigo verdadeiro merece mais que isso.

Querer bem é ser responsável pelo outro
A amizade é uma palavra que se aplica às pessoas das quais se quer o bem enquanto delas pode-se esperar certa reciprocidade. Amigo é aquele que desejamos ver feliz e que quer nos ver do mesmo modo. Muitas pessoas demonstram não ser amigas tanto nos momentos difíceis quanto nos momentos alegres da vida de seus conhecidos. Para ser amigo é preciso alegrar-se com a alegria de outro e ajudá-lo em suas tristezas. Diz Aristóteles que “quando há reciprocidade, a boa intenção é a amizade”. Levando em conta que a amizade é um sentimento que obedece aos limites dos laços humanos, ela exige sempre reciprocidade. Não é, neste caso, apenas um sentimento, mas uma construção de laço com o que há de responsabilidade para sua sustentação. 

O laço que os une é o desejo do bem. Neste caso ela não é um simples sentimento, mas um sentimento complexo que envolve uma noção de liberdade do outro a ser preservada.

Amizade é, sobretudo, desejar o bem de quem se ama, não desejar seus bens, nem proveitos, nem os prazeres que advém de seus bens. Não há amizade que se sustente por interesses, nem pelo status de se ter muitos amigos. Amigo é quem tem que valer por ele mesmo, pelo que é, e não pelo que possui em termos materiais ou pragmáticos. O amigo, como pessoa, não pode ser um meio pelo qual se pode alcançar um outro fim, mas deve ser um fim ele mesmo, o objetivo da amizade.

A amizade não pode ser uma máscara. Por isso, sua noção envolve sempre a verdade da relação para que seja algo excelente. Só é amizade se for verdadeira. Descobrir que um amigo não era verdadeiramente amigo é uma dor que pode ser maior que a perda de um amor. A um amigo, não basta, ser agradável ou útil, mas ter caráter. Nele não está em jogo a paixão que nos torna cegos e, por isso, por ser a amizade uma escolha com forte carga de racionalidade e consciência, sofremos tanto quando somos enganados. A rigor, podíamos ver e saber tudo e nos percebemos traídos por nós mesmos.

UMA PALAVRA SOBRE A PALAVRA VIDA - Márcia Tiburi

Por uma teoria do estado de exceção na linguagem

No atual estágio histórico em que pensamento e moral compõem dois lados de uma única banda torna-se impossível ler, dizer ou ouvir a palavra vida sem cuidado filosófico – pelo menos para quem deseja ser justo com o conhecimento preservando, pela busca, a possibilidade de sua realização. Não é possível alegar ingenuidade sobre a questão quando o termo vida foi capturado por toda sorte de ideologias, o que exige que sobre ele se opere uma desmontagem crítica. A disputa sobre o termo vida corresponde na ordem do discurso ao que para além do discurso se dá com a própria vida que, sob a palavra, é ocultada. Não querendo reeditar apressadamente nenhum nominalismo como crítica do discurso, é necessário hoje prestar atenção se já não estamos vivendo uma nova era nominalista em que a posse do nome define a posse sobre a possível verdade das coisas. Quem sabe o que é a vida como uma verdade para além de todas as possíveis definições? Esta verdade talvez não exista, mas aquele que a controlar saberá do seu império no tempo. Por isso, muitas disputas conceituais hoje, na verdade são disputas políticas. Saber é poder mais uma vez. Hoje, porém, poder, mais que nunca, é dizer. Quem não souber das disputas ideológicas corre o risco de parar de pensar por conta própria ao simplesmente aderir a falas prontas facilmente encontráveis no mercado das crenças.

A vida, portanto, precisa hoje, ser analisada como uma questão de discurso. A captura da palavra vida - sabem os que manipulam o discurso ou dele se valem num contexto comunicativo – define a intenção da captura da própria vida. Da vida enquanto é capturada pela palavra como ordem simbólica que impera sobre o real. A relação entre as palavras e as coisas ainda está na ordem do dia. Em outras palavras, quem puder definir vida, saber-se-á seu dono e senhor, assim dos poderes a ela associados. A tarefa hoje é reler a palavra buscando entender em que medida ela se tornou lugar da verdade sobre a qual sempre se disputa no discurso.

O poder do discurso, entendido como fala pré-estabelecida em nome da verdade, advém de seu ocultamento como tal. Em outras palavras, fala-se da vida como se estivesse a falar da própria coisa, e não de uma palavra que, ela mesma, é já conceito e, como tal, sempre elaborado, re-elaborável e passível de discussão. A palavra, por mais que se agregue à coisa, que se diga em nome de algo, não é a própria coisa à qual alude ainda que as próprias coisas precisem dela para chegar à cultura. Por isso, nos dias atuais, enganamo-nos ao discutir a vida – este amplo e inespecífico conceito que vai da natureza à cultura, da mera vida às suas formas e que como idéia é aquilo dentro do que estamos. Disputamos quem vence no contexto da crença para saber quem deterá o poder dos que podem crer (seja no que for que creiam, na ciência ou na religião). A pergunta a ser feita neste momento histórico é – para além do sexo dos anjos, da alma das mulheres ou da “vida” dos embriões – se poderíamos discutir o conceito de vida sabendo que se trata apenas de um conceito e, assim, ultrapassar a retórica e o desejo de persuadir e libertar a verdade à qual apenas uma disputa honesta de conceitos poderia nos levar. A questão seria precisar em que sentido a palavra é usada a cada vez que, como uma bandeira, é erguida em nome de guerra ou de paz.

Por isso, é preciso falar com cuidado e pressupor o próprio ato de fala como algo que merece análise. Portanto, usar a palavra vida supondo a ingenuidade de quem não imagina o seu lugar entre outros tantos conceitos é má-fé. Não é possível participar de uma discussão sem demonstrar o pressuposto a partir do qual se fala. Ninguém pode pensar filosoficamente, ou seja, em sentido analítico e crítico, ou dialético e crítico, sem definir com máxima exatidão o uso do termo que, historicamente, se constrói como um conceito dos mais complexos e sobre o qual as disputas mais acirradas se travam. Supor esta ingenuidade ou falar a partir dela é sempre a primeira estratégia de quem, cinicamente, não quer se enfrentar com argumentos, de quem quer afirmar suas idéias pondo-se como inimputável numa disputa. Quando digo a outrem que sei o que é vida enquanto ele não sabe, se afirmo que detenho a verdade sobre um conceito enquanto ele não, estou falsificando o meu próprio lugar como sujeito de discurso, que se afirma a partir de pressupostos culturais e formais que organizam o discurso. Se afirmo que sei imediatamente o que é a verdade, já me coloco como seu possuidor e exijo uma postura de atenção. A mesma atenção que me esquivo de ter com a possível postura de outrem. A melhor arma numa disputa em que algum nível retórico está em jogo nem sempre é a autoridade, mas a ignorância. Esperto é quem sabe usar a postura do burro como plano de argumento.

A palavra “vida” encontra-se neste lugar especial na atualidade, lugar que, a qualquer momento, é ocupado por qualquer palavra com a qual se deseje entabular a verdade. A questão hoje apenas pode ser refletida por uma teoria do “Estado de exceção da linguagem” por meio da qual se investigue o modo como se pretende, na ordem do discurso, se capturar a verdade e decidir sobre ela por meio da captura de uma palavra. O poder do discurso situa-se na palavra tomada como arma de decisão. Ao sacralizar a palavra “vida”, afirmando que falar dela ou contra ela é uma blasfêmia ou heresia, espera-se sacralizar a própria vida à qual a palavra se refere como se, por meio da palavra, já se tivesse decidido sobre a coisa.

Apenas uma teoria organizada sob a tese de que a linguagem, como parte de toda estrutura política, está sitiada por uma ordem que oculta seu próprio funcionamento, que a linguagem, como o corpo está “capturada fora”, incluída e excluída como no mesmo mecanismo do estado de exceção, é que se compreenderá o que se diz e o que se quer com isso ao pronunciar a palavra vida.

Ela está na ordem que faz do discurso a verdade. Duas posturas são visíveis nos dias de hoje. A daqueles que ainda enfrentam o potencial conceitual da palavra, o que se pode dizer por meio dela, ou o que ela pode significar em relação ao real. Tratam da palavra vida como uma palavra junto de outras. Compreendem-na como inserida na ordem do discurso à qual é preciso sempre prestar atenção. Por outro lado, há aqueles que falam dela como uma exceção.

UM ESPELHO PARA O NOVO SEXO FRÁGIL - Márcia Tiburi

Sobre as vantagens do feminismo 
na vida dos homens

O feminismo foi uma grande revolução cujos resultados continuam a merecer análise. Historicamente afirmado como um conjunto de procedimentos teóricos e práticos que pretendiam tanto ajudar na demolição dos preconceitos que impediam o alcance de direitos das mulheres, quanto desmanchar uma imagem da mulher como subalterna do homem, o feminismo chegou ao século 21 dito de muitos modos. 

É possível amá-lo e odiá-lo, mas não negar seus efeitos. Um dos efeitos mais curiosos do feminismo diz respeito à visão que os homens passaram a fazer de si mesmos e ao modo como são hoje representados por mulheres. Vejamos o que isto quer dizer.

Todos as correntes do feminismo desde o século 18 questionaram o lugar das mulheres como objetos dos homens. Dizer que mulheres são “objeto” para homens significa que eles, como sujeitos do conhecimento e da ação, fariam das mulheres meras “coisas” manipuláveis ou sobre as quais exerceriam sua posse. 

O feminismo levou a uma mudança de postura das mulheres que puderam, elas mesmas, se tornar “sujeitos” de suas próprias vidas e da história. O modo como mulheres eram vistas foi o que entrou em colapso com os feminismos. 

Os primeiros feminismos, de mulheres como Olympe de Gouges e de homens como Condorcet (sim, sempre existiram, ontem como hoje, homens feministas) podem ser considerados no contexto da luta pelo respeito quanto à identidade das mulheres que implicava seus direitos de cidadãs. No século 20, o cerne das lutas passou a ser a compreensão da não-identidade como um novo passo rumo à liberdade. O feminismo tornou-se a consciência da construção do “segundo sexo” com Simone de Beauvoir quando o próprio conceito de “mulher” foi posto em crise.

O que dá fundamento ao feminismo como teoria do conhecimento é a análise das representações das mulheres. O ideal da “mulher” como essência, foi alvo da crítica dos chamados feminismos da igualdade que sabem o que implica em termos de poder uma representação tanto para o bem quanto para o mal dos representados.

É uma postura comum dos feminismos contemporâneos a defesa de que já não existe o grupo representativo que entendíamos antes por “mulheres”. 

O combate à universalidade categórica que apenas favorece a estrutura da dominação foi uma ação responsável do feminismo auto-desconstrutivo, aquele que se chama feminismo enquanto rememoração de um tempo em que a luta era pelos direitos das mulheres. Hoje está em jogo inclusive o direito de não pertencer ao estereótipo “mulher”. No passado Mary Wollstonecraft dizia que o feminismo era uma luta pelos direitos da humanidade. 

A filósofa incluía homens e mulheres na sua noção de “humanidade”, em contraposição a filósofos do Iluminismo (por exemplo, Kant) que definiam a humanidade pela hegemonia masculina em que as mulheres seriam inclusas apenas enquanto dependentes dos homens.

Masculinismo” ou uma inversão de foco

Debates, pesquisas e publicações sobre masculinidade mostram que a discussão sobre a identidade dos homens evolui dia após dia. Tal busca auto-reflexiva, no entanto, não seria possível sem o feminismo. 

O “masculinismo” nascente deriva da autoconsciência dos homens sobre sua condição à deriva diante da revolução vivida pelas mulheres. Neste sentido, podemos dizer que os homens seguem o exemplo das mulheres. Mais que isso, no entanto, obrigam-se a pensar e analisar sua própria condição diante da perda de seu objeto. 

A revolução masculinista que envolve a auto-reflexividade dos homens está inserida na ética feminista que obriga hoje a olhar para o modo como não apenas as mulheres, mas também os homens foram representados. Exigem-se hoje certas releituras da história.

Bom exemplo para isto é Mme. Bovary de Gustave Flaubert. Em meados do século 19 Flaubert traduziu na imagem de uma mulher em crise com sua condição de classe, de esposa, e mesmo de amante a condição feminina em seu drama e tragédia.

Emblema do desejo insatisfeito e da perturbação com a banalidade da vida burguesa, Emma é a imagem de uma mulher que se auto-aniquila diante de seus homens e nos mostra a alegoria de uma espécie de vida contra-ética, a vida que poderia ser diferente. Emma, filha, esposa, mãe e amante infeliz, não precisaria ter sofrido o que sofreu em tempos de direitos das mulheres.

Assim foi que Flaubert, que confessou se confundir com a personagem e nos colocou para sempre na posição de perscrutadores do significado desta metáfora, representou a mulher casada, a infeliz mulher do século 19 que não tinha chance de qualquer experiência fora do reduto do lar, da casa, da pequena cidade, da maternidade, do casamento, da classe social a que pertencia, e que não fez do adultério algo menos medíocre. 

Emma, a protagonista, merece releitura. Se ela é o foco central em torno do qual transita toda a trama, é importante lembrar que ela não existiria sem os homens que a acompanham em suas aventuras e desventuras.

É para estes homens que hoje é preciso olhar. Se um dos efeitos do feminismo é que os homens aprenderam a questionar a si mesmos, devemos nós também prestar mais atenção aos homens no sentido de perceber como foram representados, ou como se representam a si mesmos. Não é apenas Emma que é construída, mas que todos os homens ao seu redor são figuras cujas características fazem deles imagens essenciais mesmo que acinzentadas diante do brilho da protagonista. 

A histeria de Emma está intimamente ligada à fraqueza dos homens ao seu redor. Homens marcados pela falta. Do marido, o ingênuo e sem perspectivas Charles Bovary, que a ama e a ela se dedica como o simples esposo que ela repudia, aos amantes Leon e Rodolphe, que representam o alter-ego subdividido de Emma, tão românticos e devassos quanto irresponsáveis e sonhadores, todos são emblemáticos de uma falta que não pode ser suprida.

Ela os supre apenas como amante, assim como ao marido a quem, na verdade, nada parece faltar já que integrado ao casamento. No entanto, jamais é suprida por nenhum deles. Nenhum é capaz de aquietar seu desejo marcado pelo insaciável. Nenhum deles corresponde ao sonho.

Os homens de Mme. Bovary não representam nenhuma solução, ao contrário, são todos anti-heróis afins à heroína que a eles se relaciona. Juntos, compõem um mosaico da condição subjetiva que, naquele tempo, veio à luz: a vida do desejo é mais que a da falta, é a da perda de qualquer esperança de que um dia homens e mulheres, juntos, possam forjar a união total. 

Flaubert, no entanto, faz a todos aqueles homens diferentes de Emma em um ponto fundamental: a vida da angústia que a torna a protagonista, não lhes pertence e isso define o saber infeliz de Emma que culmina na velha solução feminina – mas não feminista, pois seria uma espécie de decisão “de mulherzinhas” - que é o suicídio.

Mulheres falam de homens

Devemos reter da leitura deste livro o fato de que os homens são aí representados como fracos, covardes e impotentes. Numa cultura que supera em alguns aspectos a divisão sexista do patriarcado, as mulheres deixam de ser os únicos seres representados como fracos. Há uma mudança na economia das representações.

Lélia Almeida em um artigo sobre a escritor uruguaia Cristina Peri Rossi, autora e “La Nave de los Locos”, ao analisar a formação do personagem Equis (nome da letra X) chama a atenção para algo que os feminismos ainda não se deram conta, a forma como “mulheres” podem construir personagens “homens”.

O que está em jogo hoje é uma inversão radical no campo da economia política da representação. As mulheres aprenderam o poder das representações e, cada vez mais perto do poder, passaram a representar.

Está em jogo um novo olhar e um posicionamento crítico no lugar antes ocupado por um “objeto”. No livro de Peri Rossi, o personagem Equis representa o homem do novo tempo, aquele que não sabe de onde veio nem para onde vai, aquele que se depara com a multiplicidade das sexualidades e aprende a conviver com ela. 

 Equis é um novo sujeito de experiência. Aquele que, na narrativa, é incapaz de decidir se uma mulher é um homem, um travesti ou uma mulher, justamente porque este tipo de construção já não vem ao caso diante da singularidade que se tornou direito de cada indivíduo.

Infelizmente a histeria masculina que se realiza na violência, na prepotência e na queixa contra as novas formas de se ser “mulher”, inclusive aquela que abdica da inscrição em um gênero, ainda precisa ser analisada e desmontada. 

Muitos homens apegados à inscrição no gênero masculino são tocados narcisicamente pelo feminismo. No entanto, o feminismo continua atual e capaz de sinalizar para uma autoconsciência deste novo sexo frágil que não assume sua própria fragilidade. 

Neste caso, o feminismo é o melhor espelho do homem.

MÁRCIA TIBURI - O que é bonito para mim?

Em nossos dias o sentimento do belo foi reduzido à mera apreciação de mercadorias. Ninguém se preocupa com o que é “belo” para si mesmo, ou com o que “parece belo”. Dizemos que algo é bonito sem muita reflexão. Sem grandes investigações internas e pessoais sobre o modo como “eu mesmo” sou capaz de formular este juízo sobre alguma coisa ou mesmo uma pessoa. Como posso julgar a beleza de algo? E como posso dizer que alguém é ou não belo, ou “bonito”? Esta questão nascida com a cultura até hoje não foi resolvida.

Terceirizamos a beleza há muito tempo. Por um lado porque nunca foi fácil tê-la. Por outro lado, não foi simples dizer o que ela era e definir seu rumo. Até hoje padecemos da confusão em relação a um parâmetro. Cada época inventou o seu. E sempre evitamos uma apreciação original que parta da sensibilidade própria a cada um. Por isso, tantos de nós pedem desculpas quando, em exposições ou diante de um filme mais complexo, percebem que “não entendem de arte”. Mas tentaram entender?

Decidir sobre a beleza ou usá-la é algo que não fazemos sem o aval de especialistas. Chamamos os filósofos, os críticos, e até os artistas que nem sempre conhecem as teorias da arte. É claro que ninguém precisa conhecê-las. O público leigo também não tem esta obrigação. Porém, enquanto isso, os especialistas comandam o gosto coletivo e individual, definem o que é o bom e o mau gosto. Aquele que determina o gosto é dono de um poder importantíssimo. Ele administra o reino da aparência e, com ele, do desejo das pessoas pelas coisas. Mas se alguém administra meu desejo estou perdendo de fazer algo importante na vida.

Os gregos representavam Afrodite, a deusa da beleza, como uma bela jovem. Junto dela aparecia Eros, o deus do amor, na forma de um querubim a portar uma flecha e de olhos vendados sempre pronto a ferir aquele que, encantado pela beleza, mirava-a perplexo. A beleza sempre esteve junto do amor e foi a sua maior isca. Até hoje, ela desperta paixões naturais ou, bem administrada é capaz de produzi-las.

Querer a beleza, decidir sobre ela

Todos querem a beleza. Até hoje, quem consulta o galerista para saber que obra de arte acompanhará a decoração das paredes, até quem segue as dicas de um cabeleireiro, passando por quem se veste de acordo com a moda e faz a ginástica indicada, todos somos reféns de padrões estéticos que não elegemos, mas pelos quais pagamos o preço. No pacote vem o direito de não precisar decidir. E não se trata de uma obrigação da qual nos desincumbimos. Mas de um direito que não desejamos. E, mais do que um gosto que perdemos, é porque perdemos justamente “o gosto”, a capacidade da apreciação estética que sustenta a sensibilidade e evita a anestesia geral para o prazer e também para o sofrimento em relação a si mesmo e o outro.

De um lado temos, em nossa vida cotidiana, que decidir sobre a beleza das coisas. É difícil pensar que algo seja belo independente de seu valor de mercado, seja o mercado dos bens materiais, dos objetos de decoração, das roupas, da arquitetura, dos carros. Se todos querem as coisas belas pagam pelo belo e o obtém. Hesíodo, o poeta grego, conta que as musas diziam que “o que é belo é caro, o que não é belo não é caro”. Talvez o valor neste caso não fosse o da riqueza material apenas, mas também espiritual. Neste ponto, o único sofrimento em relação ao alcance do belo é o do poder de compra de cada um. Mas isso não reduz o sentido do que é realmente “belo” para cada um de nós?

A beleza de nossos corpos

De outro lado, além de julgar a beleza das coisas, há um julgamento sobre a beleza que se dirige ao corpo de cada um. Acostumamos a pensar a beleza de nossos corpos também dentro de um mercado que, tanto quanto a medida e a forma dos objetos em geral, também estabelece a forma dos corpos. Mas o corpo humano não pode ser pensado como uma coisa. Isto seria reduzi-lo a objeto que podemos manipular, trocar e vender: a conseqüência seria a legitimação da prostituição, da escravidão e até da tortura.

As obras de arte nos ajudam a recriar sentimentos

A padronização do gosto atual sobre nossos corpos é proporcional à desvalorização de nosso sentimento para o belo. É o próprio valor do belo e, antes dele, o valor do sentimento que ruiu em nossa sociedade. É claro que, diante disso, o corpo de cada um é esquecido por ele mesmo.

A desvalorização do sentimento do belo em favor de sua aplicação à mera qualidade das coisas que podem ser vendidas ou compradas mostra o declínio da subjetividade nos dias de hoje. As obras de arte ainda nos ensinam o gosto. Quem tem paciência para a contemplação ou coragem para o desafio que elas implicam poderá descobrir a sutileza da experiência estética. A experiência com o olhar ou a audição, e também com a gustação, o olfato e o tato, podem nos ajudar a chegar mais perto das coisas e descobrir nelas a “beleza”, ou seja, aquilo que nelas nos toca e tem a chance de colocar poesia em nossa vida e nos salvar das meras mercadorias.

MÁRCIA TIBURI - O Aborto dos Outros

O documentário de Carla Gallo “O Aborto dos Outros” é o enunciado direto da dissimulação com que se trata a questão do aborto no Brasil atual.

Há motivos distintos para os pronunciamentos sobre a questão do aborto nos dias de hoje. Motivos formulados como opiniões que, atenciosamente lidos, mostram-se acobertadores do que realmente se visa com a proibição legal desta prática tão familiar. Tais motivos devem ser analisados na intenção de colocar a questão no seu lugar devido, a saber, que o aborto é um problema das mulheres e que homens e instituições, para os quais o sexismo – a determinação da diferença sexual em que a mulher é vista como o “sexo” em si mesmo - é um método de controle, buscam o domínio do discurso sobre o aborto. Não poderia ser diferente já que o aborto no modo como é tratado no Brasil atual apenas faz ver o estatuto do poder na mão – e mais precisamente na ordem do discurso - dos homens contra as mulheres. Neste sentido, cabe também levar em conta que há para além da proibição da prática, certa evitação do ato de teorizar em torno do aborto por parte das mulheres. Homens falam sobre o aborto, mulheres – com raras exceções – parecem não se sentir confortáveis em defender a própria causa. Mas é claro que não se trata apenas disso. Deixar que as mulheres decidam não é uma prática desejável em um sistema patriarcal e é preciso começar impedindo que falem.

A propósito, o patriarcado é o lugar em que mulheres são submetidas pelo discurso. Não deve, portanto, ser entendido apenas como um modelo universal da racionalidade, da ética e da estética que dele decorrem organizando-se como ideologia, mas como a prática cotidiana desta racionalidade que instrumentaliza mulheres. Ora, o patriarcado não é apenas metafísico, mas deve ser visto em seu fundamento ético-político que se define pela ação contra as mulheres. Assim é que ele se constitui como o nome próprio da violência que costura um pensamento e uma prática contra mulheres da família à publicidade, da maternidade à pornografia.
Dizer contra neste caso é definir rigorosamente que as mulheres que ainda podem ser subjugadas pela ilegalidade do aborto são as social e economicamente desfavorecidas. Aquelas que permanecem sob comando biopolítico, sem supor que possam ser senhoras de seus corpos. Sem interpretações próprias sobre o que seja seu corpo, sua vida própria, mulheres pobres são reduzidas à condição de fêmeas procriadoras para logo depois serem rebaixadas, caso pratiquem o aborto, à condição de meras rés por terem ido contra a ordem. No senso comum brasileiro vige o discurso de que a realização das mulheres está na maternidade e na feminilidade. Quem não obedecer a esta ordem do discurso poderá ser punida cruelmente.
Que a sociedade se torne mais democrática quer dizer que o patriarcado cede diante da escolha das mulheres sobre seu próprio corpo. E esta escolha se afirma em um discurso como reação contra a ordem patriarcal sexista que até os dias de hoje é mal quisto em várias instâncias deste Brasil subjugado política e ideologicamente ao patriarcalismo.

Duas formas de silêncio

Mulheres, as verdadeiras implicadas na questão do aborto raramente se pronunciam sobre ele. Há pelo menos duas formas de silêncio em jogo nesta questão. Em primeiro lugar o silêncio derivado do comodismo e da alienação. Um silêncio cultural que define o poder da fala como algo masculino e, por contraste, “anti-feminino”. Mesmo hoje em dia muitas mulheres caem na armadilha essencialista, aquela que defende que mulheres não devem falar demais para evitar a tagarelice de que são acusadas desde a tradição filosófico-literária. No discurso essencialista, tem-se que “a mulher” é uma essência não-falante. Desconsidera-se a formação cultural, histórica e social que constitui o gênero. Desconsidera-se o controle discursivo que está por trás de toda definição. Assim é que uma mulher deve calar, como se a fala articulada, que expõe idéias, fosse contra a natureza das mulheres e não uma construção jurídico-cultural.
Este silêncio é alienado, ele é produzido. Sua conseqüência é o fato histórico de que as mulheres como “classe” ou grupo não construíram teorias, não foram autorizadas, nem se autorizaram a serem teóricas, cientistas, ou políticas, ou seja, seres que dominam o funcionamento do discurso e podem exercer poder a partir dele, seja no campo do conhecimento, seja no campo da política profissional.
Mas há outro silêncio. Aquele que é praticado sem alienação por mulheres ideologicamente livres do patriarcado. Moralmente descomprometidas, ou financeiramente livres não precisam responder às suas imposições. Praticam abortos conforme necessidades pessoais/corporais sem que ninguém ou nenhuma estatística precise sabê-lo. Não dependem do sistema público de saúde, não precisam se confessar ao padre, muitas vezes nem mesmo tem uma vida de casal com um homem ao qual devam prestar satisfação sobre seus atos. Quem são, o que desejam, como e onde o fazem é algo que permanece sob o véu da clandestinidade que, neste caso, não é mais do que o fato da realidade. Clandestina é toda prática possível que mostra a insuficiência da lei e as contradições da moral.
Kafka no conto “O silêncio das sereias” afirmou que o silêncio das sereias é uma arma mais terrível que seu canto. Talvez alguém tenha escapado de seu canto, mas certamente ninguém escapou de seu silêncio, diz Kafka. Tal silêncio é a liberdade das mulheres insuportável ao patriarcado. É também sua arma. Infelizmente, no entanto, como arma ele não está ao alcance de mulheres desfavorecidas cultural e economicamente. O documentário de Carla Gallo mostra mulheres que são vítimas do discurso e do sistema quanto à impraticabilidade do aborto, mulheres que sofrem sob o jugo do patriarcado como se fossem meros animais que desobedeceram seus senhores.

Habeas Corpus

O documentário O Aborto dos Outros é, neste sentido, a exposição de uma reivindicação real do direito sobre o próprio corpo. Ele faz pensar que a questão do aborto no Brasil deve ser tratada segundo o direito do habeas corpus. Válido para aqueles que podem pagar por um advogado, o direito de habeas corpus deveria ser elevado a princípio mais que jurídico quando se trata da relação entre mulheres e seus corpos. O habeas corpus deveria ser tomado culturalmente, tornando-se uma verdadeira ética no combate à apropriação que o patriarcado exerce sobre o corpo das mulheres. O corpo das mulheres deve ser devolvido às próprias mulheres. Ou se perdeu no tempo ou nunca existiu o consentimento para que homens - a sociedade como um todo? - comandassem corpos de mulheres particulares, seu desejo de ser ou não ser mães.
A discussão sobre a abstrata questão da vida do embrião presente no corpo de uma mulher que não deseja desenvolver um feto não passa de elemento acobertador do controle biopolítico sobre corpos de mulheres. Do mesmo modo, não podemos mais nos ocupar da discussão que corre no senso comum e que divide a população entre ser a favor ou contra o aborto quando na verdade se trata no Brasil de hoje de ser a favor da legalização do aborto ou contra a legalização do aborto. A questão da legalização é jurídica e como tal, problema de poder, de saber quem comanda, quem decide, quem detém a verdade a seu próprio favor.
Somente a luta das próprias mulheres poderá mudar este estado da questão. Enquanto isso, alguns homens mais lúcidos porque livres do discurso patriarcal e percebendo que o tema não lhes diz respeito, associam-se às mulheres na luta por uma sociedade mais justa.
Mas somente as mulheres poderão buscar a justiça para si mesmas e para aquelas que como elas sofrem na coleira do patriarcado. 

MÁRCIA TIBURI - Conversar é uma forma de amar

O diálogo foi uma das questões mais importantes no surgimento da filosofia. Serviu de modelo teórico de uma ação prática. Platão, na antiguidade clássica, usou-o como estilo para mostrar que a filosofia dependia da conversação. Ele queria mostrar que ela não era uma teoria isolada das relações humanas. 

Que nascia da diferença do pensamento de cada um que entrava em contato com o pensamento de outro. Chegou a dizer que o pensamento era o diálogo da alma consigo mesma num sentido muito próximo do “falar com os próprios botões” que conhecemos tão bem. Pensar era uma questão de linguagem.

O pensamento precisava das palavras, da gramática, da língua, do imaginário, do mito, para se expressar e, por isso, o cuidado com a escolha e o uso de todos estes elementos era tão essencial.

Da conversação é que surgem todas as nossas relações sociais: desde a família até as decisões políticas, passando pela amizade e pelo amor. É porque não sabemos que a arte da conversa é muito mais do que a mera persuasão, que convencimento ou sedução, que perdemos de vista sua função ética. Conversar serve para criar laços sinceros e reais. Com ele se funda o que chamamos sociedade cujo laço essencial é o amor, segundo Humberto Maturana, importante biólogo e filósofo chileno da atualidade.

Ninguém conversa mais
Desaprendemos de conversar por alguns motivos. Um deles é o descaso que temos com as palavras. Nem nos preocupamos em conhecê-las, não avaliamos a história da humanidade que nelas se guarda. Não imaginamos que palavras tão comuns quanto liberdade, memória, história, pensamento, prática, e tantas outras possuem uma vasta história. E não se trata apenas da etimologia, da origem dos nomes, mas da função simbólica, do que está guardado nas palavras como sentido que vai além delas e mostra o mundo humano dos afetos, sentimentos, desejos, projetos. Não apenas os poetas e escritores devem cuidar das palavras, mas todos os humanos.

Conversar é perigoso, dizem os donos do poder
A má política, aquela que se separou da ética, sempre soube o quão perigoso para si mesma era a conversação. Nos campos de concentração da Alemanha nazista era comum a separação de prisioneiros de mesma língua e o convívio de prisioneiros de nacionalidades diferentes. Podemos chamar “violência simbólica”, segundo a expressão do sociólogo do século XX Pierre Bordieau, a este gesto de impedir o contato pela palavra. Sabiam os nazistas que este era um procedimento de tortura mental e também de proteção do regime. 

Sabiam que a conversa sempre aproxima os seres humanos por criar afetos e, deles, pode surgir algum projeto que modifique alguma coisa que alguém desejava ver sempre igual. A conversação cria cumplicidade. Por isso, todas as instituições autoritárias proíbem a conversação.

Mas o problema maior em nossa sociedade atual é o fato de que incorporamos a proibição da conversa. Introjetamos o medo do contato. Não sabemos mais conversar, perdemos o estímulo quando caímos em depressão ou morremos de medo quando somos tímidos. A frase de Sartre “o inferno são os outros” muitas vezes pode nos socorrer diante do pavor do contato e da relação mais íntima com quem poderia vir a ser um amigo.

Quantas vezes parecemos conversar, mas isso não ocorre. Conversações estranhas, porque sem diálogo, aparecem quando numa festa, num encontro casual, ou na escola, no trabalho, ou mesmo em casa, contamos sobre um filme que vimos. A pessoa a quem nos dirigimos, quem deveria conversar sobre o que lhe dizemos, recorre imediatamente a outro filme que ela viu ou diz não gostar de cinema. Fazemos isso e assim nem conversamos sobre o filme assistido por quem narra o fato, nem o visto por quem o ouve. 

Perdemos a capacidade de prestar atenção no que foi dito. A capacidade de escutar está em extinção. 

Se usarmos outro exemplo perceberemos o fenômeno de modo ainda mais claro: quando alguém fala de seus problemas, o outro, aquele que deveria ouvir, sempre comparece com seus exemplos interrompendo a atenção necessária à exposição do primeiro, quando não chega a dizer “não quero ouvir, pois isso não me acrescentará nada”, como se conversar – o que fazemos de mais humano - fosse uma troca mercantil de lucros e ganhos. Ou ainda, interrompe com um “eu sei” prepotente, inviabilizando toda descoberta. Em outras palavras, nos tornamos – em graus variados - incomunicáveis. Em tempos de comunicação de massas, numa sociedade estimulada pela mídia que nem sempre cumpre com seu papel de comunicar, esta se tornou uma questão essencial.

O que teremos a nos dizer no futuro?
Walter Benjamin dizia que a incapacidade de narrar experiências comunicáveis resulta das experiências negativas que sofremos. Um soldado que vai a guerra é o seu exemplo, mas podemos usar nossos mais próximos: aquele que vive na rua sem lar, o que vive na miséria material qualquer que seja, aquele que se sente só num asilo, num orfanato, num hospital. 

Que criança será capaz de sobreviver em sua intimidade se nenhuma linguagem será capaz de expressar o sofrimento que ela viveu na pele perambulando pelas faróis e, do outro lado, não havendo ninguém que possa ouvi-la? Que poderá ela nos dizer se chegar a ser adulta? Não temos o que dizer aos descendentes de escravos, aos aviltados históricos deste país?

O que temos nós, de fato, a dizer e a ouvir desta esta criança nas ruas? Elie Wiesel, autor de A Noite, quando criança assistiu à morte por enforcamento de um menino num campo de concentração. A condenação fora a condenação do futuro e de toda a humanidade. Mas ainda podemos corrigir os erros. Melhor começar conversando direito, descobrindo o que temos a dizer e ouvir.

MÁRCIA TIBURI - O mistério da corrupção

A tradição teológica e filosófica nunca conseguiu explicar o “mistério da iniquidade”, a existência do mal como potência do desejo e da ação humanas.
Ora, a corrupção é o mal do nosso tempo. Curiosamente, ela aparece como uma nova regra de conduta, uma contraditória “moral imoral”. Da governalidade aos atos cotidianos, o mundo da vida no qual ética e moral se cindiram há muito tempo transformou-se na sempre saqueável terra de ninguém.
Como toda moral, a corrupção é rígida. Daí a impossibilidade do seu combate por meios comuns, seja o direito, seja a polícia. Do contrário, meio mundo estaria na prisão. A mesma polícia que combate o narcotráfico nas favelas das grandes cidades poderia ocupar o Congresso e outros espaços do governo onde a corrupção é a regra.
Mas o problema é que a força da corrupção é a do costume, é a da “moral”, aquela mesma do malandro que age “na moral”, que é “cheio de moral”. Ela é muito mais forte do que a delicada reflexão ética que envolveria a autonomia de cada sujeito agente. E que só surgiria pela educação política que buscasse um pensamento reflexivo.
Pobre, mas honesto
O sistema da corrupção é composto de um jogo de forças do qual uma das mais importantes é a “força do sentido”. É ela que faz perguntar, por exemplo, “como é possível que um policial pobre se negue a aceitar dinheiro para agir ilegalmente?”
O simples fato de que essa pergunta seja colocada implica o pressuposto de que uma verdade ética tal como a honestidade foi transvalorada. Isso significa que foi também desvalorizada.
Se a conduta de praxe seria não apenas aceitar, mas exigir dinheiro em troca de uma ação qualquer na contramão do dever, é porque no sistema da corrupção o valor da honestidade, que garantiria ao sujeito a sua autonomia, foi substituído pela vantagem do dinheiro.
Mas não somente. Aquele que age na direção da lei como que age contra a moral caracterizada pelo “fazer como a grande maioria”, levando em conta que no âmbito da corrupção se entende que o que a maioria quer é “dinheiro”.
Verdade é que a ação em nome de um universal por si só caracteriza qualquer moral. É por meio dela que se faz o cálculo do “sentido” no qual, fora da vantagem que define a regra, o sujeito honesto se transfigura imediatamente em otário.
Se a moral é medida em dinheiro, não entregar-se a ele poderá parecer um luxo. Mas um contraditório luxo de pobre, já que a questão da honestidade não se coloca para os ricos, para quem tal valor parece de antemão assegurado.
Daí que jamais se louve nos noticiários a honestidade de alguém que não se enquadra no estereótipo do “pobre”. Honesto é sempre o pobre elevado a cidadão exótico. Na verdade, por meio desse gesto o pobre é colocado à prova pelo sistema. Afinal ele teria tudo para ser corrupto, ou seja, teria todo o motivo para sê-lo. Mas teria também todo o perdão?
O cidadão exótico – pobre e honesto – que deixa de agir na direção de uma vantagem pessoal como que estaria perdoado por antecipação ao agir imoralmente sendo pobre, mas não está. A frase de Brecht seria sua jurisprudência mais básica: “O que é roubar um banco comparado a fundar um?”.
Ora, sabemos que essa “moral imoral” tem sempre dois pesos e duas medidas, diferentes para ricos e pobres. No vão que as separa vem à tona a incompreensibilidade diante do mistério da honestidade. De categoria ética, ela desce ao posto de irrespondível problema metafísico.
Pois quem terá hoje a coragem de perguntar como alguém se torna o que é quando a subjetividade, a individualidade e a biografia já não valem nada e sentimos apenas o miasma que exala da vala comum das celebridades da qual o cidadão pode se salvar apenas alcançando o posto de um herói exótico, máscara do otário da vez?

A Casa Encantada & À Frente, O Verso.

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